quarta-feira, 16 de junho de 2010

Alma Perdida, por Tiago Ramos



Título original: Cold Souls (2009)
Realização: Sophie Barthes
Argumento: Sophie Barthes
Elenco:
Paul Giamatti, Lauren Ambrose, David Strathairn, Boris Kievsky, Jennifer Connelly, Katheryn Winnick e Emily Watson

Mesmo quem nunca tinha visto nenhum filme dele, nem que seja pela fama e pelo passa-a-palavra, associará facilmente este Alma Perdida a um argumento saído da mente de Charlie Kaufman. O surrealismo, originalidade e espírito inventivo remete claramente para obras como Being John Malkovich (1999) ou até o mal-amado Synecdoche, New York (2008). Obviamente que em comparação, este Cold Souls fica a perder em pormenores como a subtileza ou o tom de comédia screwball, mas como primeira-obra não se deve colocar de lado.



Sophie Barthes estreia-se assim nas longas-metragens com uma frescura já rara na indústria cinematográfica. Começamos assim com uma aura clássica: O Tio Vânia, do dramaturgo russo Anton Tchékhov. Uma obra clássica que dá o mote para o filme, porque no seu sentido ocupa-se de anseios, frustrações e desejos de mudança. Daí até nos embrenharmos na personagem de Paul Giamatti é um passo. Porque Paul Giamatti é Paul Giamatti. O próprio. O actor a fazer de si mesmo: o actor. (A semelhança com John Malkovich não é gratuita).

Paul Giamatti é um actor amargurado. Perturbado pelas angústias pessoais. No fim de contas, a alma é mais um empecilho que uma ajuda. Traz consigo memórias, emoções. Peso a mais para um actor que não se consegue diferenciar da sua personagem. A solução? A extracção da alma, por um processo cirúrgico, altamente simples, que dá a oportunidade de a enxergarmos por dentro ou de simples a guardarmos num frasco até ao dia em que resolvemos recolocá-la.



Daí que pelo absurdo da situação o filme soa a comédia, mas na verdade a componente dramática está sempre presente e é impossível não nos deixarmos contagiar pelo estado nostálgico e melancólico de Paul Giamatti. Cold Souls torna-se mais profundo do que à partida poderíamos supor, situando-nos no plano filosófico e da moral. Damos de caras com reminiscências de Franz Kafka e a alienação. Joga com René Descartes e encara a alma como uma pequena glândula do nosso cérebro. Critica e questiona a sociedade padronizada, mas encontra ainda espaço para explorar a temática dos encontros espontâneos da vida.

Em ritmo, o filme perde pelas diferenças constantes e acentuadas que o tornam cansativo em determinados pontos da história. Perde também em não saber gerir muito bem a linha ténue entre drama e comédia. Mas o espírito inventivo do argumento, aliado a uma fotografia tecnicamente exímia da autoria de Andrij Parekh (Blue Valentine), fazem deste Cold Souls uma obra que não deve ser menosprezada.

Classificação:

4 comentários:

  1. O filme passou muito despercebido mas desde que vi uma entrevista a Giamatti sobre a temática deste filme, tenho imenso interesse em vê-lo e, pelo que dizes, nem se sai nada mal.

    Abraço
    Cinema as my World

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  2. Não é extraordinário, mas gostei bastante.

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  3. Eu nem sabia deste novo filme do Giamatti! Como fã não assumido do actor, tenho de ver! Obrigado pela crítica, Tiago! :)

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  4. Ainda é capaz de estar em algumas salas de cinema, portanto será de aproveitar.

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