sábado, 1 de outubro de 2011

Os Famosos e os Duendes da Morte, por Carlos Antunes


Título original: Os Famosos e os Duendes da Morte
Realização: Esmir Filho
Argumento: Esmir FilhoIsmael Caneppele
Elenco: Áurea Baptista, Ismael Caneppele e Tuane Eggers

Um filme que vive de um simbolismo realista numa cidade do Brasil em que a solidão parece ser uma condição inevitável.
Por isso há uma ponte que liga a cidade ao resto mundo mas que quase ninguém parece conseguir atravessar. Lançam-se dela ao tentarem fazê-lo.
E há um dos seus habitantes - um jovem fixado em Bob Dylan - que vive fascinado por alguém que já dela saltou, olha-a nas imagens dela que ficaram guardadas num blogue.
Ele parece igualmente duvidoso da travessia, mas arranjou uma ponte própria e com a qual é mais fácil lidar: a escrita e a conversa online. E mesmo dessa ele duvida, fartando-se dela e sentindo que "estar perto não é físico".
O filme não é sobre angústia adolescente, talvez seja sobre saudade, certeza apenas que é sobre esse jovem que escolhe apresentar-se como "Tambourine Man".
Aí começa a queda do filme no espaço da indiferença do público. O filme tem pouco a dizer para lá de uma história de amor impossível guiada por algo tão comum ao nosso quotidiano e que se revela uma máquina do tempo que "junta" dois seres desfasados.
Entre o simbolismo da ponte real e a absorvência de um jovem pela falsa eternidade da memória online não há uma verdadeira ligação. A cidade em torno dele não é - nem contem - personagem e ao fim de algum tempo o filme está como que fixando-se no vazio.
O realizador não deixa de filmar com bastante bom gosto e encanto alguns dos pequenos cenários em que se passa a história, mas a história quase não está lá.
Isto é uma história de amor, uma história de fixação, uma história da tal solidão de que falei no início. É isso mas não sabe o que fazer com isso, onde o levar, e termina no mesmo ponto ao qual chegou ao fim dos primeiros minutos. Pelo caminho perde-se pelos espaços sem se perder o suficiente para nos fazer perder em pura contemplação.
O problema do filme, estou em crer, vem dos diversos elementos com que se muniu e os quais tinha de tocar ao longo do tempo que dura.
Esmir Filho ficcionalizou em torno de achados que fez online. As fotos e os vídeos publicados levaram-no a encontrar os seus actores amadores. E daí acabou por trabalhar a história que já tinha pilares fixos para o que viria a ser.
O que pode ser uma acção interessante para o debate do género de material de origem que serve ao cinema ou como integrar a individualização das imagens numa construção apontada a um público alargado,não serve obrigatoriamente a fazer um bom filme.
Pois se tinha de tocar os pilares achados, não pareceu que tivesse realmente de os envolver na adaptação do livro que estava a fazer. Por isso a história existe um pouco como se os elementos descobertos na realidade local quase não importassem. Não se vê fazer parte do filme o significado da música de Bob Dylan no tempo do jovem ou a inevitabilidade de só aqueles vídeos e fotos da rapariga servirem o amor que a juventude permitia lembrar demasiado mal.
Estão lá desaparecidos, como as pessoas que saltaram da ponte. Tomamos conhecimento deles por vozes alheias sem nunca os sentimos.
Não basta a Esmir Filho citar a beleza feérica da juventude tal como Gus Van Sant a descobriu e esperar que o espaço vazio em volta se preencha por si mesmo.
Corre o risco que o seu filme, como no verso de Dylan, desapareça "através dos anéis de fumo da mente em direcção às nevoentas ruínas do Tempo".



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