segunda-feira, 27 de setembro de 2021

Um Lugar Silencioso 2, por Eduardo Antunes


Título originalA Quiet Place Part II (2020)
Realização: John Krasinski
Argumento: John Krasinski

Como tantos outros casos, o sucesso do que se poderá considerar um relativamente pequeno empreendimento sob a forma de A Quiet Place levou à inevitável e talvez injustificada criação de uma sequela, no que se revelou um claro lucro dado o baixo orçamento patente no primeiro filme mas que acaba por não recapitular a novidade do primeiro, antes repetindo e tirando o efeito do mesmo.

De início, não poderia ter sentido um maior sorriso do que aquele que crescentemente se me esboçava à medida que assistia à cena inicial do filme, numa decisão acertada de aproveitar a oportunidade de ver este filme na versão que o cartaz acima clama para que vejamos. Pois é esse formato que melhor faz por destacar as capacidades que crescentemente Krasinski demonstra enquanto realizador e que maior impacto oferece aos eventos representados.
O enfoque em elementos dramáticos que conhecemos do primeiro capítulo, ou em elementos que de maior forma nos enquadram a geografia dos eventos seguintes, a utilização ocasional do silêncio para impactar de maior forma os momentos que se seguirão, os planos contínuos que nos permitem manter a atenção nos diversos elementos em cena e guiar a nossa visão. Tudo elementos sem dúvida expectáveis para uma boa realização mas que ilustra um pensamento narrativo pensado e eficiente, na sua controlada aplicação neste género (e especificamente no início deste capítulo), conseguindo oferecer o impacto a uma cena em analepse para a qual sabemos não haver consequências para os protagonistas, ao mesmo tempo que faz por nos apresentar elementos narrativos relevantes ao filme em mãos, e traz expectativas para o que veremos seguidamente.

Rapidamente nos apercebemos, no entanto, do impacto que esse prólogo tem no restante filme, já que o que faz por aí nos demonstrar nunca será igualado ou superado, sequer narrativamente. Existe já uma repetição das mesmas rítmicas batidas, em que as cenas de tensão começam a perder o seu impacto, por revisitarem o mesmo número finito de cenários em que a questão do som enquanto sinalizador de perigo iminente é aplicável. Chegará sempre a um ponto em que um dos protagonistas fará um ruído que inicia a fuga seguinte, havendo muitas das vezes o surgimento de uma personagem no momento chave para resolver a situação, onde antes os cenários eram criados de forma às personagens chegarem a uma sua própria resolução. 


Mesmo no nosso eventual acompanhamento de três diferentes situações em simultâneo, com diferentes personagens em diferentes graus de perigo, uma dessas situações é potenciada por uma decisão insensanta de uma das personagens, não coadunável com o carácter que tem vindo a demonstrar até então, apenas para a criação de um momento de tensão de outra forma inexistente.
E onde no original existe o gradual surgimento do potencial da "arma" descoberta, aqui já conhecemos os seus efeitos e, portanto, toda e qualquer tentativa de expectativa em relação à sua utilização perde-se no nosso conhecimento exacto da sua aplicação, que resulta mesmo na revisitação quase exactamente igual do final do filme anterior. Se o elemento essencial à experiência da premissa se torna redudante e desprovido do seu esperado impacto, pelo que poderemos esperar então?

Assim, da mesma forma é patente uma tentativa de expansão da ideia inicial e do universo subjacente, na ilustração das consequências dos eventos numa população obrigada a sobreviver por quaisquer meios necessários. Recebemos dicas de alguns grupos de pessoas desprovidas da sua humanidade, reduzidas à rotina de armarem engodos para que outras pessoas sejam apanhadas em seu lugar. Dicas que nunca resvalam para o restante argumento, onde nunca se tornam ameaça constante em paralelo às criaturas já conhecidas, apenas mais um inútil obstáculo, já que nenhuma personagem perece ou sofre consequências permanentes.
E onde no acto final é-nos apresentado a noção de um pedaço de terra rodeado da substância que as criaturas não podem atravessar, finalmente um reduto onde o som é uma possibilidade sem receio de represálias, não é oferecido o tempo suficiente para saborearmos a calma antes da tempestade (qual exercício hitchcokiano), onde poderíamos acompanhar finalmente o assentamento das nossas personagens, sabendo a eventual e inevitável queda desse descanso, tendo em conta a premissa da narrativa que fatídicamente as assolaria.

Talvez Krasinski tenha ganho experiência no seu papel enquanto realizador, mas se veja ainda necessitado de maior experimentação e aprendizagem enquanto argumentista, onde as mãos extra do primeiro filme poderiam ter cooperado novamente para um foco mais claro, explícito, como o primeiro filme sabia delinear, através da âncora das quatro únicas personagens existentes. E se aqui os restantes membros da família são fixação suficiente para manter o nosso investimento emocional, caso haja um terceiro capítulo é necessário que a fórmula seja revista, de forma a não se tornar completamente estanque e desprovida do impacto que relembramos da nossa primeira ingressão neste universo. 


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