sexta-feira, 29 de julho de 2022

Casa Gucci, por Eduardo Antunes


Título original: House of Gucci (2021)
Realização: Ridley Scott

Existem diversas serializações biográficas dedicadas a grupos familiares afectados por excêntricas vicissitudes às quais, no seu formato alongado, lhes são permitidas um enfoque episódico em personagens, temas ou épocas distintas, cuja atenção dividida nos permite absorver a história mais eficazmente. Formato do qual me recordei aquando dos obrigatórios escritos finais informativos do destino das diversas personagens, relembrando a minha própria necessidade de gastar mais tempo em cada uma delas, em particular a que devia acarretar, juntamente com a personagem de Lady Gaga, o conflito central de toda a história.

Neste formato cinematográfico, é perdido o ritmo acertado para um franco desenvolvimento desta extensa narrativa, naquilo que acaba por resultar numa edição desenfreada por entre personagens e/ou eventos, mesmo considerando os totalizados 150 minutos de duração do filme. Sintoma provável do seu estatuto enquanto adaptação cinematográfica de um livro que, sem conhecimento, imagino extenso na sua eventual narração exaustiva dos eventos.
Se, ao ver a duração, brincava com a ideia de Ridley Scott permitir-se finalmente lançar nos cinemas a sua visão longa e inadulterada do seu filme previamente ao lançamento caseiro, vejo essa afirmação contraditada, no que se nota ser um esforço de compactar tanto a um único filme. Um filme com um alcance de duas décadas de história, onde o Maurizio de Adam Driver não se sente como segundo protagonista, antes nada mais que um engenho narrativo com maior tempo de ecrã.


Desde o início era aparente a falta de tempo dedicado a este protagonista. Por num particular momento vermos Adam Driver recuar um passo perante a expressiva autoridade do pai Rodolfo (Jeremy Irons), para imediatamente dar lugar à próxima conversa reconciliada entre ambos.
Mesmo quando já na sua relação matrimonial com Patrizia, se dá o primeiro confronto entre o casal, sentindo Maurizio pela primeira vez a pressão da sua companheira perante a reputação do nome da família, presenciamos esse primeiro conflito patente numa breve expressão de Driver, imediatamente saltado por cima para contar os eventos seguintes.

Nem sequer a repentina excentricidade de Maurizio parece saída da sua emancipação –seja da aceitação que procura do seu pai ou da que aparenta encontrar na relação "amorosa" que surge com Patrizia– mas antes enquanto um mero conjunto de lugares comuns, através do típico reencontro com a amiga de infância por entre antigas memórias reavivadas e inportunos gastos económicos para a impressionar.
Poderia até ter sido de algum interesse, aproximados do final, entender o ângulo do seu renovado interesse na reputação da empresa que nunca lhe suscitara atenção nas décadas anteriores, interesse esse inicialmente surgido por parte de Patrizia que entretanto abandona em detrimento de um sentimento possessivo e controlador do seu destino na família.

Se era o intuito um enfoque na personagem de Maurizio e na sua trágica condição enquanto peão por entre vontades familiares a ele alheias, acaba por ficar retido numa limitada ilustração da sua emotividade perante a sua relação com Patrizia. Foca-se o filme pontualmente no estado emocional de Maurizio, o suficiente para este se sobressair do cenário no qual se move, embora nunca o suficiente para justificar a sua figuração frontal neste filme, por si só já demasiado cheio e sem qualquer intuito, por trás e em frente da câmara, que nos permita guardar na memória qualquer momento do filme. 




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