sábado, 20 de março de 2021

WandaVision - Temporada 1, por Eduardo Antunes


Título original: WandaVision (2021)

Finalmente, a Marvel encontra o formato mais acertado para as histórias alongadas em que as suas personagens se baseiam e as quais requisitam a maior duração que o formato televisivo oferece.
E, no entanto, prefere esta mini-série voltar a justificar-se antes pelo (nem sequer interessante) mapeamento posterior de outras materiais, não tirando o inteiro potencial da sua particular formalização, que aqui ainda mais se justificava e pedia, por ser a própria estrutura televisiva, na sua génese, o elemento estrutural de toda a série, desde o título que básica mas inteligentemente mapeia. 

Mesmo na transição entre diferentes séries cómicas que cada episódio vai apresentando reconhecemos o paralelismo com a própria situação mental e relacional (com Vision) da protagonista. Onde o optimismo do que parece uma vida idealizada dos anos 1950 em que inicia a série vai dando lugar ao olhar mais irónico e (de certo modo) realista das relações em causa nos anos 2000, à medida que a mesma relação entre Wanda e Vision vai evoluindo nas conturbações que ela própria criou. Até o ocasional anúncio televisivo, apropriando-se das preocupações de cada época para ilustrar igualmente algum aspecto das memórias de Wanda, revela o brilhantismo da proposta da série.Apesar das realidades paralelas, poderes místicos e seres cibernéticos, mesmo na intencional evolução acelerada da relação reconhecemos uma ponta de realidade, para a qual os próprios actores contribuem em grande medida. Olsen e Bettany carregam a maior parte do trabalho, numa química inegável e adaptação a cada novo papel divertida e atractiva em todos os momentos.




Em momentos específicos, é até interessante verificar um exercício quase metalinguístico na forma como acompanhamos os diferentes episódios da série que Wanda cria, onde começamos a assistir aos bastidores da mesma no decorrer dos próprios episódios. Quando os actores secundários questionam se devem repetir a cena do início, questionam a falta de crianças na cidade, param a sua actividade em fundo, ou se começam a aperceber dos eventos que eram suposto ser segredo, vamo-nos aos poucos apercebendo do que poderão significar os estranhos acontecimentos, sem termos necessidade de qualquer explicitação que a série, a partir do quarto episódio, nos dá. 

É assim que a grande e francamente desnecessária falha da série surge. Após três misteriosos mas empolgantes episódios, recuamos ao início para estabelecer uma série de eventos e personagens em paralelo que em nada contribuem, na verdade, para a narrativa principal. Pois, se às tantas até acompanhamos Vision na descoberta do que se passa na cidade em que vivem, já a série nos revelou isso mesmo de outra maneira (muito menos interessante), revelando-se essas cenas quase como o obrigatório acrescento para estabelecimento de futuras personagens para subsequentes filmes e/ou séries que retira o interesse narrativo das primeiras.

Aliás, em todos os momentos em que se dava uma transição para a "realidade", para a narrativa secundária, não havia uma única altura em que os meus olhos não revirassem. Porque tão bem estamos envolvidos na deturpada mente de Wanda e na sua inaptitude em se conformar com o seu próprio luto que, quando mudamos para uma série de procedimentos para a tentar impedir, por uma série de genéricos elementos de mais uma desinteressante agência governamental com um ulterior motivo, simplesmente não nos interessamos. Por querermos desde o início que seja a própria Wanda a desfazer as consequências das suas próprias acções ou, simplesmente, a falhar tragicamente e, assim, vermos apenas no final as consequências de toda esta criação paralela que traz mais consequências (pessoais) do que inicialmente temos noção.




E ao sétimo episódio, vamos denotando uma mais óbvia forma de ilustrar narrativamente o conflito com Wanda, onde outras personagens a tentam impedir das suas acções com comuns discursos, ao mesmo tempo que Vision, na mesma demanda de descoberta, continua a participar na estrutura da série cómica em que desconhecidamente se encontra. Revelam-se, assim, ainda mais estranhas transições e edições numa série que, a este ponto, perdeu o seu inicialmente tão bem colocado foco. Ainda mais quando percebemos que, independentemente do que Wanda criou, existem mais forças em jogo que retiram muito do dramatismo até aí criado. Wanda deixa de ser a vulnerável personagem que desde a sua primeira aparição sabemos ser, para ser (novamente) mais uma peça no puzzle sem limites deste universo.

Assim, continua a Marvel a falhar a potencialidade de um compromisso com o descortinar das ferramentas que já domina, preferindo utilizá-las superficialmente para chamar a atenção da audiência e depois, apenas dar-lhes mais do que já conhecem e estão prontas a aceitar. A alongada analepse em que o penúltimo episódio da série se decompõe mostra tão obviamente isso, ilustrando a história que já conhecemos sem experimentar com a meta-estrutura explorada até meio da série, e o último episódio é o típico terceiro acto de qualquer um dos vinte e três anteriores filmes, onde o anterior uso inteligente de retrocessos televisivos dão lugar a efeitos visuais sem medida. Ainda assim, não deixou (o início d)a série de arrancar alguns dos meus mais sinceros sorrisos destes últimos tempos. Talvez num universo paralelo pudéssemos ter recebido o definitivo resultado do que nos era proposto. 



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