terça-feira, 6 de outubro de 2009

Séraphine, por Tiago Ramos



Título original: Séraphine (2008)
Realização: Martin Provost
Argumento: Martin Provost e Marc Abdelnour
Elenco: Yolande Moreau, Ulrich Tukur e Anne Bennent

De pintor e de louco todos temos um pouco. Esta máxima poderia muito bem adaptar-se à história de vida de Séraphine Louis, conhecida por Séraphine de Senlis. Séraphine foi a coqueluche da edição 2008 dos prémios César arrecadando 7 dos nove galardões para os quais estava nomeado. O motivo? É uma biopic dotada de um digno espírito académico com uma protagonista quase em estado primitivo.



Martin Provost filma uma atípica história de quem é uma força da Natureza, dotada de uma vocação raríssima para a Arte, por quem não teve formação artística. Séraphine limpa o chão com a mesma intensidade com que pinta uma tela. Uma compulsão para a pintura, uma necessidade de se perder no meio dos pincéis e da tinta (que com tanto afinco e sabedoria fabrica, a partir de ingredientes naturais). Séraphine de Senlis exercia uma relação espiritual enquanto pintava, cantava enquanto o fazia, deixava de comer para pintar. Todos os recursos que ganhava a limpar casas gastava-o no exercício da sua arte. Não vivia da Arte. Vivia, sim, para a Arte.

O realizador não deixa de filmar Séraphine com tiques académicos, planos demorados, quase ausência de diálogos e banda sonora, deixando o espectador a sós com a protagonista e a sua solidão e loucura. Mas é na cinematografia de Laurent Brunet que o filme ganha um novo fôlego. Fotografa como se pintasse, dá-nos planos austeros e clínicos, monocromáticos, mas extremamente realistas.



Yolande Moreau traz uma das maiores prestações do ano, uma surpresa quando se trata de dar a vida a uma mulher obsessiva, fascinante e algo louca. Obsessiva e muito independente. Mas um pouco naïf também, ou primitiva, como diria o seu mecenas. Mas é essa sua ingenuidade que a conduz numa espiral descendente, onde a fronteira entre o génio e a loucura quase se fundem sem avisar. É essa ingenuidade que a faz perder-se na perspectiva de um dia vender todos os seus quadros e criar uma exposição em Paris. Ingenuidade que a conduz à sua última morada: um manicómio francês.

Séraphine é uma poderosa biopic, que se enfraquece a si própria na visão clínica e às vezes distante com que aborda a história, nunca se perdendo em histórias e artifícios desnecessários, mas talvez por si só interessantes. Um estilo académico puramente francês, mas dotado de uma fantástica força da Natureza, um tratado sobre o sonho, a ambição e as vocações.

Classificação:



2 comentários:

  1. A não ser pelas tuas palavras, ainda não tinha conhecimento deste filme. A actriz, adoro-a desde os tempos de AMÉLIE. É fabulosa. A crítica adorou o filme, quero muito vê-lo.

    Cumps.
    Roberto Simões
    CINEROAD - A Estrada do Cinema

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  2. Roberto F. A. Simões,
    É um filme muito erudito, é normal que a crítica especializada o adore. Mas sim, é bastante bom. Quanto a Yolande Moreau não me recordava dela no Amélie, mas tem uma performance estrondosa.

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