domingo, 10 de abril de 2011

Chelsea Hotel, por Carlos Antunes


Título original: Chelsea on the Rocks
Realização: Abel Ferrara
Argumento: Abel Ferrara, David Linter e Christ Zois
Elenco: Vito Acconci, Donald Baechler e Stanley Bard

Terá sido o primeiro filme de Abel Ferrara de que não gostei. Falta-lhe aquela energia crua, a violência premente do que está a filmar.
Sabendo de que neste caso filmou para defender o hotel do título, a culpa disso fica evidente.
Um realizador com uma nota de intenções, ou mesmo uma causa se assim lhe quiserem chamar, acaba por tornar o seu filme num panfleto.
Nem sempre racional na leitura do quê e do como que deve permanecer ou não na montagem final.
Neste caso a quantidade do que não devia ter ficado e sido apresentado ao público é enorme.


O filme é maioritariamente um conjunto de entrevistas aos habitantes correntes do hotel, artistas em muitos casos, pessoas de traços curiosos, a quem Ferrara deu a oportunidade de se mostrarem.
O ego de todas elas fica à solta, dando lugar a longos discursos auto-indulgentes que se tornam maçadores porque estas pessoas não têm interesse real, mas fabricam-no para o filme.
Os seus talentos e desventuras são certamente casos de interesse para quem os conheça, mas para os restantes, que estão à espera de compreender a essência de um hotel, aquelas histórias não têm nada para nos dizer.


O filme só não é um desperdício completo porque há um antigo habitante do hotel que surge para falar das suas memórias.
Quando o faz, há algum fascínio que se gera no espectador por encontrar uma dose de realidade poética na forma como ele o conta.
O imaginário da "maior queda de água depois das Cataratas do Niágara" que ele relata para demonstrar o que aconteceu à água usada para apagar um incêndio ao cair pelas escadarias é algo que contribui verdadeiramente para que pensemos no Hotel Chelsea como um lugar de ocorrências interessantes.
Isso sim contribui para compreender o que fascinou tantos artistas: eventos que por ocorrerem ali ganhavam nova luz.


Enquanto, pelo contrário, aquela reprodução do drama de Sid e Nancy no Hotel, não gera mitificação mas justifica a decadência do hotel.
Não são momentos como aqueles que enobrecem um lugar ou o tornam património de uma cidade.
Ferrara conseguiu, ao contrário das suas intenções, mostrar como o local perdeu interesse e classe. Mostrou que os bons tempos do Chelsea ficaram no passado e que deram agora lugar a um prolongado estado terminal da inspiração e da singularidade que Cohen e Warhol registaram.
Abel Ferrara filmou os últimos momentos do Hotel Chelsea e demonstrou que o seu destino pode ser justificado.



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