domingo, 15 de abril de 2012

Scialla!, por Carlos Antunes


Título original: Scialla!
Realização: Francesco Bruni
Argumento: Francesco Bruni
Elenco: Fabrizio Bentivoglio, Filippo ScicchitanoBarbora Bobulova e Vinicio Marchioni

Há uma cena durante os créditos finais que é a síntese das razões pelas quais este filme existe. Nela, um criminoso cujo gosto pelas Artes lhe vale o cognome d' "O Poeta", tenta convencer o seu biógrafo a reescrever a história da sua detenção com uma perseguição e muitos tiros pois isso fará com que o filme - para o qual ele já vendeu os direitos do livro - venda mais bilhetes entre os jovens que adoram sonhar com o glamour de uma vida de crime.
O biógrafo, antigo professor do preso e a sua maior influência no gosto por François Truffaut ou Pier Paolo Pasolini, levanta-se e sai dizendo "Não, não, não!".
Afinal de contas este é o mesmo homem que ao longo do filme vimos reerguer-se como ser humano em boa parte devido à descoberta de ser o pai de um adolescente cujo maior sonho é ser revendedor de droga - e de vir a emendar a vida deste.
Assim nos diz o filme que o seu propósito não é dar a quem constitui a maioria do público pagante aquilo que se julga que este quer, mas antes promover alguns valores sociais e culturais que valiam no passado e que devem continuar a valer.
A história é suficientemente simples para se perceber de início que entre o confiante mas desinteressado rapaz de 15 anos e o velho escritor desanimado que descobre que é seu pai acabará por ser formar uma relação mais forte do que aquela que muitos pais e filhos conseguem criar vivendo juntos desde o nascimento destes últimos.
E, pelo caminho, conseguirão renascer como indivíduos nos aspectos do que pareciam já ter rejeitado em definitivo: afecto(s) para o pai e conhecimento para o filho.
O filme faz-se de comédia muito bem escrita, valorizada pela forma como consegue fazê-la a partir de temas que pareceriam impossíveis de juntar.
As melhores relações são também as que proporcionam os melhores momentos dessa comédia e fazem-se com temas que não poderiam estar mais distantes um do outro. Por um lado Bruno tem de ensinar a Luca os extraordinários valores de que fala a Ilíada, por outro tem de escrever a biografia de uma antiga estrela pornográfica sem sequer entender nada do vocabulário associado ao género.
Também não será por acaso que com o primeiro desses textos ele não consegue mais do que levar o jovem a usar comparações futebolísticas e a rir-se da homossexualidade que imperava na Grécia Antiga, enquanto que à medida que escreve o segundo texto não só consegue ser psicanalisado pela sua interlocutora como ainda descobre que há muito a admirar por detrás de uma escolha de vida como a que tem de descrever.
A escrita é boa, mas resulta melhor entregue a este trio de actores em particular onde há que destacar o estreante Filippo Scicchitano.
Ele consegue incorporar realisticamente o seu amadurecimento ao longo do filme enquanto, ao mesmo tempo, revela a dependência que tem da mãe apesar de se mostrar um independente e arrogante como todos os adolescentes.
A seu lado, o confiante trabalho de Barbora Bobulova é mais discreto mas igualmente agradável, não tornando ridículo nem implausível o seu papel de mãe que fez o que era necessário para criar o filho.
Mas julgo que será impossível não reconhecer que se sai da sala encantado com o estilo que Fabrizio Bentivoglio aplica e em que tenta prevalecer o lado calmo e inspirador da sua personagem numa situação em que está completamente atrapalhado (como parecia já estar para a vida antes de Luca lhe aparecer em casa).
Por isso, a estreia de Francesco Bruni na realização, depois de o ano passado o festival já nos ter mostrado o seu talento como argumentista em La Prima Cosa Bella, deveria ter direito a uma estreia nacional alargada, tão capaz que foi de deixar o público animado.
Até porque a passagem para a cadeira de realizador parece ter sido fácil e deixou a agradável noção de que ele escreveu para si mesmo uma história que lhe toca tal como ele sabe que tocará a todo o público que se não é pai, foi inevitavelmente filho.



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