domingo, 25 de novembro de 2012

Cloud Atlas, por Tiago Ramos


Título original: Cloud Atlas (2012)
Argumento: Tom TykwerAndy Wachowski e Lana Wachowski
Elenco: Tom HanksHalle BerryJim BroadbentHugo WeavingJim SturgessDoona BaeBen WhishawKeith DavidJames D'ArcyXun ZhouDavid GyasiSusan Sarandon e Hugh Grant

Cloud Atlas parecia um daqueles romances simplesmente intransponíveis para o cinema. Se já o livro de David Mitchell parecia megalómano na sua intenção; o estilo, formato e ambição da história parecia impossível de adaptar visualmente de uma forma coerente e satisfatória. Mas no final de contas, o controlo criativo do trio composto pelos irmãos Wachowski e por Tom Tykwer, revela-se suficientemente ambicioso e criativo para que o resultado final não envergonhe a obra épica do autor. Já a forma como o filme será recebido por cada espectador dependerá com certeza de outros factores externos que não apenas os técnicos e narrativos, mas principalmente da forma como nos deixamos envolver por uma história ambiciosa e rica em detalhes que transmite uma mensagem moral de conexão entre a humanidade, com conceitos como karma ou reencarnação. É esse núcleo emocional, nas mais variadas formas, que prenderá - ou não - o espectador à tela e que o deixará a sentir-se, mais ou menos, recompensado pelo investimento na história. Obra de intrincado trabalho mental, Cloud Atlas melhora a cada visionamento, quando o espectador passa a identificar cada vez mais ligações (algumas delas deliciosamente subtis) a seis histórias aparentemente não relacionadas entre si, mas que no fundo se unem a uma única mensagem: a da união cósmica.

A história divide-se em géneros e tempos narrativos tão distintos quanto um diário de bordo durante a escravatura do século XIX, um romance na Europa pós-guerra em 1931, um thriller político na Califónia dos anos 70, uma comédia do mundo editorial no tempo presente, uma sociedade  corporativa distópica e futurista com nuances de ciberpunk no antigo território da Coreia do Sul e um futuro pós-apocalíptico. Cada história que, individualmente e à sua maneira (umas melhores que outras) contribui para deixar o espectador numa constante alteração de estados de espírito, entre a emoção e as gargalhadas. Os realizadores optaram por deixar de lado o carácter isoladamente episódico do livro e assumem a conexão entre as histórias, com uma montagem de Alexander Berner numa constante alternância entre épocas e personagens. O resultado pode, por vezes, parecer confuso aos olhos do espectador - daí que este filme mereça mais que um visionamento - mas a forma como é feita é a mais simples que seria possível a uma história desta envergadura.

Tecnicamente, o trabalho é impressionante. Desde a realização dos irmãos Wachowski - responsáveis pelas sequências futuristas - e de Tom Tykwer - autor das sequências de época e contemporânea, passando à já referida montagem ou à fotografia de Frank Griebe e John Toll. É impossível não mencionar ainda a excelente e variada banda sonora de Reinhold Heil, Johnny Klimek e Tom Tykwer que se divide consoante a época, mas frequentemente unida com o fabuloso tema conhecido como Cloud Atlas Sextet. O guarda-roupa, efeitos visuais e a maquilhagem são dignos de nomeação ao Óscar, se bem que no caso da maquilhagem, existem casos onde a par de um bom trabalho, há também um excessivo grau de caracterização - alguns quase ao nível da caricatura - especialmente nos casos de envelhecimento.

Não menos excitante é o desafio que o elenco enfrentou, com os actores a dividirem-se entre personagens distintas, ao longo das eras - por exemplo, Tom Hanks e Hale Berry, desempenham, cada um, seis papéis distintos e alguns irreconhecíveis. O trabalho dos actores acompanha a intenção narrativa, consoante o género da história e a época - Jim Broadbent tem sempre um desempenho incrível, mas a sul-coreana Doona Bae é a estrela do filme, roubando cada cena que protagoniza. Mas esse trabalho de caracterização e interpretação - riquíssimo e impressionante - segue também a ideia geral da narrativa. Não é então de estranhar que as seis personagens desempenhadas por Hugo Weaving sejam quase sempre a de vilão: há pois uma coerência a nível cármico, que acompanha o trabalho do actor - uma das suas personagens parece a personificação do próprio mal.

Cloud Atlas não é um filme isento de falhas graves. Mas dentro de toda a sua ambição, acompanha incrivelmente bem a sua ideia geral, sendo mais um bom exemplo de como um blockbuster não precisa de se isentar de inteligência e subtileza. A recepção variará conforme o espectador e dependerá dos seus maiores ou menores preconceitos, bem como a sua abertura às teorias que aborda. Mas a jornada em que embarcamos ao assistir ao filme é tão poderosa quanto satisfatória, especialmente se nos deixarmos conduzir pelos diferentes graus de emoção que transportam o espectador até uma recompensa incrivelmente bela e impossível de descrever. Se é verdade ou não, tanto faz.


Classificação:

1 comentário:

  1. Ainda estou na fase de "digestão" mas a minha reacção geral ao filme é que não gostei. O que não signifique que não mude de opinião entretanto. A ideia de vários visionamentos do filme para compreendê-lo melhor é desde já algo que me incomoda. Rever um filme deveria ser um prazer e não uma necessidade. Ainda por cima não me senti deslumbrada o suficiente para querer revisitá-lo. O meu problema número um começa com o elenco de onde só se salva o Hugo Weaving, o Jim Sturgess e a Doona Bae.
    Depois a dado momento comecei a aborrecer-me de morte e até adormeci, vendo-me obrigada a recuar o filme uns bons 20 minutos. Sempre na expectativa de ver compreender melhor o entrelaçamento das histórias. Finalmente o filme parece ganhar velocidade e todas as histórias unificam-se, a mensagem está lá, é bonita, compreendemo-la mas... três horas para isto?! É que parece tão pouco. Ou um final errado. Há ali outros finais de história que teriam sido mais interessantes que aquele. Para mim foi um anti-climax, foi demasiado utópico, demasiado clean e perfeito. Resumindo:
    É muito grande, tem momentos bons, outros secantes, um elenco que me repulsa mais do que agrada, um terço final muito bom com um desfecho banal.
    O grande ponto positivo é que despertou em mim a vontade de ler o livro que até ao momento não tinha.

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