quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Bling Ring: O Gangue de Hollywood, por Tiago Ramos


Título original: The Bling Ring (2013)
Realização: 
Argumento: 
Elenco:  e  


Sofia Coppola sempre filmou o aborrecimento e o vazio como ninguém. Temas  sempre transversais à sua filmografia, abordadas e filmadas sempre de forma distinta, mas com essa linha em comum. Interessa-lhe a trágica beleza da futilidade, do vazio, essa melancolia de alguém preso a si próprio, sem objectivo. Se isso é ou não o seu próprio reflexo, de uma prisioneira no seu próprio mundo glamoroso, não saberemos com certezas. Mas o seu olhar sobre os habitantes desse estranho habitat aprisionador é único. Assim como já em Somewhere (2010) se focava nesses problemas de ricos mimados (o mesmo tinha acontecido com os seus outros filmes), em The Bling Ring vai mais além e filma a futilidade, assim como o fascínio pelas celebridades, mas sem arrependimentos ou crescimento das suas personagens (ao contrário do que acontecia com a evolução de Johnny Marco em Somewhere). Isto porque o seu olhar é também ele parte da realidade, tentando reconstituir eventos reais e absolutamente constrangedores - mas também incrivelmente assustadores pela leviandade como se encara o sucedido. Filmam-se aqui os habitantes desta gaiola dourada, ricos e mimados, mas também eles perseguidores de uma fama superior à sua. E apesar de facilmente encontrarmos algumas semelhanças com Spring Breakers (2013), não é da inconsequência da juventude contemporânea de que se fala. Obviamente que torna tudo muito mais surreal se atentarmos à idade das personagens, mas a fama, o fascínio e a futilidade que aqui se olham é transversal à sociedade ou não assistíssemos nós à proliferação diária de "notícias" e produtos relacionadas com "famosos".

A fama (e a imoralidade da sua perseguição) vem aqui na forma destes querem saber como vivem os seus ícones da moda, as celebridades que o são apenas por partilharem o seu estilo de vida desregrado, esbanjador e desajustado. A fama que chega por simplesmente aparecer. Quer-se aparecer. Quer-se fazer parte daquele mundo, ao mesmo tempo que se vive preso a ele. Quer-se mostrar, fazer-se ver. «What did Lindsay say?», diz a dada altura uma personagem, referindo-se a Lindsay Lohan quando esta descobriu ser vítima de um assalto. Esta frase tão simples (quanto deliciosamente irónica) é denunciadora desse síndrome da busca pela fama e pelos seus ícones. Sofia Coppola filma tudo com a sua elegância característica, com uma direcção de fotografia fabulosa e último trabalho do recém-falecido Harris Savides, a quem o filme é dedicado. Filma a futilidade e os objectos como quem filma o vazio que sempre filmou. Filma quem se quer apenas ajustar e integrar aos seus pares e sociedade, também eles desajustados. Filma-o sem julgamentos, mas também sem tentativa de justificação - e por isso transmite uma falsa noção de personagens rasas - mas também porque aquelas personagens/pessoas reais são também elas vazias, desprovidas de sentido, mas sobretudo de arrependimento. Porque tudo se faz, tudo se manipula. Daí que aquelas cenas em que uma Emma Watson, transfigurada, tudo faz para perseguir a sua fama, desavergonhadamente manipulando a realidade e usando bordões de Miss Universo, são absolutamente deliciosas, mas também bizarras. Afinal tudo é válido para aparecer.

Poder-se-á especular, dizendo que parece porventura que Sofia Coppola usa o seu cinema como terapia do próprio complexo de culpa e da sua vivência aprisionada num mundo de opulência. Talvez. Mas o seu ponto de vista em The Bling Ring é mais atento à situação contemporânea do que poderia ser, sendo menos inócuo e inconsequente do que faz parecer, dizendo muito mais nas entrelinhas do que aparenta.


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