quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

A Hora Mais Negra, por Carlos Antunes



Título original: Darkest Hour
Realização: Joe Wright
Argumento: Anthony McCarten
Elenco: Gary Oldman, Kristin Scott ThomasBen Mendelsohn


Gary Oldman não necessita de confirmação estatuária para o seu percurso de perfomances extraordinárias. A acontecer, teria até sido mais elegante dar-lhe há seis anos atrás, quando a Academia não lhe opôs ninguém à altura do seu George Smiley.
O seu Winston Churchill deverá sair premiado apesar disso pois são estas construções que dão mais prazer a quem vota nos Oscars, o desaparecimento do actor no interior de uma figura pública. Sobretudo quando há materiais através dos quais comparar o original à sua reprodução.
Merecerá o prémio. Oldman deleita-se com a oportunidade de fazer de Churchill. Não pelo político larger-than-life recordado mas pelo homem pleno de teimosias e caprichos com que ele pode dar verve ao papel.
Este é o tipo de interpretação que "faz" um filme por si só. Apenas quando o filme não está a combatê-la cena a cena.
Devia ser Anthony McCarten a proporcionar cenas onde Churchill encontrasse matéria para se afirmar, pela personalidade vincada que Oldman faz sobressair, como o grande estadista que ousou defender uma posição mesmo quando esta era minoritária entre os seus colegas e divisiva para o país.
O argumento devia destacar-lhe a força de actuação e não contradizê-la como na já famosa - e ridícula ao máximo! - cena do metropolitano em que Churchill vai tomar o pulso à vox populi para saber como actuar.
Apagar a crença que Churchill tinha de saber responder ao que o Reino Unido precisava e não ao que queria apenas para culminar o filme com uma cena sentimentalista é um erro gigantesco para um filme que quer ser condigno com a História.
Como o é a personagem de Elizabeth Layton, bengala para que a composição de Churchill progrida no sentido de se tornar tocante. Como se fosse necessário nutrir carinho por Churchill para admirar a sua actuação ao longo daquele mês.
Havia, isso sim, de lhe ter sido dado um adversário digno de nota, para ser arrumado de forma virulenta. Ainda que a comicidade de um "importa-se de parar de me interromper quando o estou a interromper a si" seja parte daquilo com que Oldman se diverte a ser Churchill.
Em cima disso vem Joe Wright combater Oldman pelo destaque maior de cada cena, afirmando um discurso descoordenado com a interpretação, mas que lhe permite mostrar os seus dotes de executante.
A sua composição cénica é mais uma vez teatral, sempre dependente de um foco de luz que, mesmo quando pretende representar a luz natural grita com falsidade.
Churchill é a luz no meio das trevas. Isto quando não está claustrofobicamente enclausurado por elas.
Ou quando não é o único rosto lúcido por entre os alertas vermelhos que engolem o seu país... A menos que essa luzes vermelhas sejam já o anúncio do inferno que só ele prevê.
As metáforas de Wright permitem quase todas as interpretações dentro daqueles lugares-comuns que se têm de aplicar a Churchill.
Não permitem que se sinta vida nas cenas, cada vez mais estruturas isoladas entre si. Se antes Wright fazia uma cena de alto valor (artístico) acrescentado por filme que não se ligava com o restante que ele filmava, agora parece convencido a fazê-lo em todas as cenas. O resultado é cansativo, nada mais.
Argumento pífio e realização presunçosa. Muitas vezes contradizendo-se entre si e criando a confusão sobre o que o filme alguma vez pretendeu ser.
Admirável é que a interpretação de Oldman seja entretida e envolvente dentro de um filme que nunca vem em seu auxílio. (Só por isso Oldman vai merecendo a estatueta que no início se refere.)
Tenderá a ver-se nisso a forma de melhor expressar a isolada grandiosidade da figura de Churchill. A execução do filme como a expressão imprevista do que este queria dizer e não conseguiu.




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