Título original: The Shape of Water
Realização: Guillermo del Toro
Argumento: Guillermo del Toro, Vanessa Taylor
Elenco: Sally Hawkins, Octavia Spencer, Michael Shannon, Richard Jenkins
Um conto de fadas para adultos. Espera-se um filme em que os elementos fantásticos impulsionam a descoberta pessoal à medida que expõem os desafios que aguardavam tornar evidente o percurdo do "herói".
No "para adultos" está o cerne da questão, havendo de estabelecer o ponto de depressão de onde parte quem busca a sua própria superação.
A Elisa, por ter sido maltratada em criança, falta-lhe a voz o que a fez sentir incompleta pela vida fora. Até ver a criatura enclausurada, não se percebe que incompletude significativa é essa
Parece viver um contentamento silencioso. Apaixonada por musicais, rodeada de outros excluídos como ela e com um trabalho sem glamour mas onde a sua falta de cordas vocais a deixa mais confortável do que o contrário.
A única falha expressa é a de um parceiro sexual. Nada que não tenha um cariz genérico, capaz de gerar empatia sem qualquer desafio.
O mesmo se deve dizer dos amigos que a rodeiam, uma mulher afro-americana que com ela partilha o trabalho e um velho homossexual encapotado que com ela partilha a morada. Mais dois elementos desprezados pela sociedade e unidimensionais.
Para se opôr a eles há o vilão de Michael Shannon que, apesar de ser escrito para que não restem dúvidas que quem estiver contra ele está do lado correcto, é o personagem que mais perto está de ter ambiguidade.
Apesar de ser a encarnação do Mal - ou, como a narração de abertura diz, o verdadeiro "monstro" do filme - ele tem de cumprir com as difíceis exigências de sucesso, sinónimos de masculinidade: as da sociedade-modelo vinda dos anos 1950 e as da vida militar. Não por acaso o apelido do seu personagem é Strickland.
Por comparação com esta caracterização, olhe-se para o espião russo, cujo pensamento científico coloca a admiração pela espécie acima de qualquer lealdade pátria, e para o Anfíbio, que mesmo ao alimentar-se de uma gata é desculpado pela sua natureza selvagem.
Mesmo no sexo - incorporação pela qual Guillermo del Toro pensa ter atingido o estatuto "para adultos" - é Strickland a protagonizar algo pensável.
Ele é exposto ao público comportando-se de acordo com as pulsões que sente. Para ser caracterizado como bruto, naturalmente, mas tornando-se assim a única personagem a assumir a dimensão realista da matéria.
Elisa masturba-se e que acabará por fazer sexo com o Anfíbio. O primeiro acto não passa de um apontamento e o segundo ocorre de uma casta forma dançada, numa cena tão exageradamente fantasiosa que torna difícil haver um envolvimento emocional com a mesma.
Essa cena de sexo tem, aliás, uma (posterior) representação mais assertiva através do dedo de uma mão do que nos brilhos coloridos do Anfíbio!
O realizador achou que bastaria referenciar de forma inofensiva - e inexpressiva! - o sexo para ele estar desenvolvido no subtexto do filme.
Para um filme inspirado em Creature from the Black Lagoon, parece não ter a noção correcta da expressão de sexualidade que era a cena de perseguição aquática, intensa mesmo sob o sufoco do Código Hays.
Como o fez para o sexo, fê-lo para o racismo, a homofobia e a obsessão pela Guerra Fria. Traçou um mundo moral a preto e branco que não exige esforços de entendimento.
Um mundo com as cores dos musicais que ele tanto referencia ao longo do filme e os quais chega mesmo a tentar reproduzir, num momento desfasado do restante do filme e cuja pouca desenvoltura o evidencia como sucedâneo sem aspiração à grandeza.
De verdadeiramente grandioso no filme temos Sally Hawkins e Alexandre Desplat, enquanto tudo o resto é agradável mas inóquo.
Num ano de nomeações arriscadas, o Oscar principal para A Forma da Água é Hollywood a admitir que prefere qualquer elogio a si mesmo e aos seus tempos maiores do que exercer a possibilidade de falar sobre o seu tempo.
No "para adultos" está o cerne da questão, havendo de estabelecer o ponto de depressão de onde parte quem busca a sua própria superação.
A Elisa, por ter sido maltratada em criança, falta-lhe a voz o que a fez sentir incompleta pela vida fora. Até ver a criatura enclausurada, não se percebe que incompletude significativa é essa
Parece viver um contentamento silencioso. Apaixonada por musicais, rodeada de outros excluídos como ela e com um trabalho sem glamour mas onde a sua falta de cordas vocais a deixa mais confortável do que o contrário.
A única falha expressa é a de um parceiro sexual. Nada que não tenha um cariz genérico, capaz de gerar empatia sem qualquer desafio.
O mesmo se deve dizer dos amigos que a rodeiam, uma mulher afro-americana que com ela partilha o trabalho e um velho homossexual encapotado que com ela partilha a morada. Mais dois elementos desprezados pela sociedade e unidimensionais.
Para se opôr a eles há o vilão de Michael Shannon que, apesar de ser escrito para que não restem dúvidas que quem estiver contra ele está do lado correcto, é o personagem que mais perto está de ter ambiguidade.
Apesar de ser a encarnação do Mal - ou, como a narração de abertura diz, o verdadeiro "monstro" do filme - ele tem de cumprir com as difíceis exigências de sucesso, sinónimos de masculinidade: as da sociedade-modelo vinda dos anos 1950 e as da vida militar. Não por acaso o apelido do seu personagem é Strickland.
Por comparação com esta caracterização, olhe-se para o espião russo, cujo pensamento científico coloca a admiração pela espécie acima de qualquer lealdade pátria, e para o Anfíbio, que mesmo ao alimentar-se de uma gata é desculpado pela sua natureza selvagem.
Mesmo no sexo - incorporação pela qual Guillermo del Toro pensa ter atingido o estatuto "para adultos" - é Strickland a protagonizar algo pensável.
Ele é exposto ao público comportando-se de acordo com as pulsões que sente. Para ser caracterizado como bruto, naturalmente, mas tornando-se assim a única personagem a assumir a dimensão realista da matéria.
Elisa masturba-se e que acabará por fazer sexo com o Anfíbio. O primeiro acto não passa de um apontamento e o segundo ocorre de uma casta forma dançada, numa cena tão exageradamente fantasiosa que torna difícil haver um envolvimento emocional com a mesma.
Essa cena de sexo tem, aliás, uma (posterior) representação mais assertiva através do dedo de uma mão do que nos brilhos coloridos do Anfíbio!
O realizador achou que bastaria referenciar de forma inofensiva - e inexpressiva! - o sexo para ele estar desenvolvido no subtexto do filme.
Para um filme inspirado em Creature from the Black Lagoon, parece não ter a noção correcta da expressão de sexualidade que era a cena de perseguição aquática, intensa mesmo sob o sufoco do Código Hays.
Como o fez para o sexo, fê-lo para o racismo, a homofobia e a obsessão pela Guerra Fria. Traçou um mundo moral a preto e branco que não exige esforços de entendimento.
Um mundo com as cores dos musicais que ele tanto referencia ao longo do filme e os quais chega mesmo a tentar reproduzir, num momento desfasado do restante do filme e cuja pouca desenvoltura o evidencia como sucedâneo sem aspiração à grandeza.
De verdadeiramente grandioso no filme temos Sally Hawkins e Alexandre Desplat, enquanto tudo o resto é agradável mas inóquo.
Num ano de nomeações arriscadas, o Oscar principal para A Forma da Água é Hollywood a admitir que prefere qualquer elogio a si mesmo e aos seus tempos maiores do que exercer a possibilidade de falar sobre o seu tempo.
A Forma da Água: 4*
ResponderEliminarO pior foi a cena cantada, o melhor foi a parte final.
Cumprimentos, Frederico Daniel.