quarta-feira, 4 de março de 2009

Vicky Cristina Barcelona, por Tiago Ramos


Um argumento fresco e pitoresco, repleto de boas interpretações. Fresco e airoso, acabado de colher. É o que nos apetece comentar após ver Vicky Cristina Barcelona. Só o nome de Woody Allen, incontestavelmente um dos realizadores e argumentistas mais completos de sempre, pode trazer desde logo a ideia de filme de qualidade. Ainda para mais quando este é complementado com um punhado de bons actores e excelentes desempenhos à frente das câmaras.



É o caso do último filme de Woody Allen. Quase um filme de encomenda, intitulado inicialmente de O Projecto Espanhol de Woody Allen, Vicky Cristina Barcelona foi escrito para se adaptar à cidade catalã e a todo o seu exotismo. Se julgávamos o autor preso à sua cidade, este tornar-se-á facilmente o seu filme mais europeu. Não é, claramente, o seu melhor filme, mas é o seu filme mais fresco. E como isso nos sabe bem.

Não é uma comédia como nos querem vender, não é também um grande drama ou um romance de faca e alguidar. Vicky Cristina Barcelona é antes um rol de multiculturalismo, com a cidade que dá nome ao filme como pano de fundo, para um cruzamento de diferentes personagens. Pena que a perspectiva fornecida por Woody Allen sobre a cidade, não é mais que a perspectiva turística. Todos os pontos turísticos de interesse estão lá, sem fazer com que a cidade se torne uma personagem, por si só, ao exemplo de como o realizador habilmente faz com Manhattan. A cor, o exotismo, a sensualidade, o espírito citadino e boémio de Barcelona estão ali completamente bem retratados.



O cunho de Woody Allen vislumbra-se perfeitamente na abordagem das relações humanas e as mulheres, mas como uma componente libertina e sexual muito mais arrojada que habitualmente. O amor trágico, o pessimismo, inconformismo, as fantasias sexuais, o adultério e o suicídio vagueiam pelo argumento. O argumento é completo, com personagens e diálogos pormenorizados, uma obra competente, que cheira a frescura por todos os poros.

No elenco, a qualidade é aquilo que veementemente mais salta à vista. Um Javier Bardem, cujo papel, ao contrário do que dizem por aí, exige muito de si, pela sensualidade e ousadia, à semelhança de um eterno macho latino. Uma Scarlett Johansson igual a si própria, divertida, estouvada, inconformada, insegura. Uma Rebecca Hall que se tornou uma das melhores surpresas do argumento, tendo a seu cargo a componente dramática e que merecia, seguramente, o Globo de Ouro pela sua prestação, mesmo que não se enquadrasse no rótulo de comédia. E por fim, uma Penélope Cruz, renovada e como há muito não a viamos: explosiva, determinada, com ‘pêlo na venta’ se assim me permitem a expressão. A sua vitória do Óscar de Melhor Actriz Secundária parece-nos justa. De qualquer modo, a actriz tem aqui uma grande parte do divertimento do filme: a agressividade, o génio e as calorosas discussões, com muito castelhano e palavrões à mistura, como uma verdadeira mulher mediterrânea. Já lhe fazia falta um desempenho assim.



Woody Allen está aqui mais sensual que nunca, sem pudores e com arrojo, entrega-nos de bandeja não um dos seus melhores filmes, mas um dos mais arrojados e quentes filmes dos últimos tempos. Um traço light, ligeiramente desorganizado, quase a roçar a desarrumação completa, mas que liberta o espectador de todas as tensões a que se poderia limitar.

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