quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Fellini 8 e ½, por Tiago Ramos



É paradoxal como um filme que retrata a crise inspiracional de um artista acabe por se tornar uma das mais belas obras de arte de sempre no Cinema. Federico Fellini vive essa mesma crise, Guido Anselmi é o seu alter-ego que sofre um processo complexo de sufoco e consequente libertação. A cena inicial retrata bem de mais essa mesma crise: um plano apertado sobre um personagem cuja angústia sentimos, mas não lhe vemos o rosto, cujos socos na janela de um carro exprimem o seu sufoco. Como um balão, acaba por se libertar, para depois acordar do seu tormento.



Federico Fellini é tradutor de sentimentos. Poucos como ele sabem colocar em imagens, aquilo que é raro alguém conseguir descrever. Poucos se sabem dissecar como ele, até pelo tratamento dado à personagem de Marcello Mastroianni, invulgar pelo tratamento crítico e cruel que não é comum na sua filmografia. O cineasta sempre trata as suas personagens com compaixão, mas aqui Guido é atormentado através da degradação física e moral, como fruto de uma auto-análise de Fellini.

Neste sistema de associações metafóricas, com 8 e ½ cria-se um delírio visual, recheada de cenários megalómanos, grandiosos e poderosos, na ânsia de conseguir a perfeição artística e física. Esta última simbolizada pela presença da misteriosa personagem interpretada pela musa de Fellini: Claudia Cardinale. A câmara de Federico Fellini é excepcional, captando a essência do ser humano e de cada uma das personagens, com uma profundidade complexa de um argumento genial. Recheado de metáforas, diálogos inteligentes, uma fotografia magnífica oscilante entre o sonho e a realidade (Gianni Di Venanzo) e uma banda sonora, da autoria de Nino Rota (La dolce vita), com canções tocadas por uma orquestra directamente em grande maioria das cenas.



E depois, lado a lado com Marcello Mastroianni como um actor bastante competente e um dos maiores de sempre, vagueiam também as mulheres de Fellini, as mulheres de Guido, as mulheres de 8 e ½: Claudia Cardinale, Anouk Aimée, Sandra Milo, Rossella Falk e Barbara Steele.

Fellini 8 e ½
(título português) é uma das mais fantásticas obras do Cinema. A confirmação de um cineasta genial, único e competente, que resulta num dos mais inspirados filmes da História do Cinema. Uma obra-prima!



Classificação:


9 comentários:

  1. Tiago, era só para avisar que já publicei as tuas escolhas
    Abraço

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  2. Crítica muito boa - e, sem qualquer sombra para dúvidas, mal posso esperar para o ver. Diz-me uma coisa, atendendo ao escrito, por que razão só 4 estrelas?

    Abraços!

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  3. Bem, a questão que me colocas é feita muitas vezes em críticas minhas. A classificação é para mim, pessoal. O texto tento ser um pouco mais objectivo - apesar de transmitir a minha opinião - de forma a não ser injusto com o filme, só por um capricho pessoal ou porque não gosto daquele género. Encaro o filme brilhante, uma obra-prima mesmo, mas para dar uma classificação superior a 4 estrelas, é necessário que o filme me toque profundamente - que faça uma mudança em mim, que mexa com algo mais. Foi o caso.

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  4. ou melhor, não foi o caso :P eu entendo perfeitamente o que dizes, então.

    abraços

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  5. Será com certeza o próximo filme do realizador que verei. Pelo que leio e pelo que vejo, espero uma obra-prima incontornável. A ver vamos. A DOCE VIDA desiludiu-me, francamente. Dentro de dias aventurar-me-ei então neste 8 1/2.

    Cumps.
    Roberto Simões
    CINEROAD - A Estrada do Cinema

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  6. Eu gostei, é um óptimo filme. Também hei-de ver o A Doce Vida. Aí trocaremos opiniões. :P

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  7. Já vi e é mesmo. Uma obra-prima genial e incontornável. Um marco revolucionário.
    5/5*

    Cumps.
    Roberto Simões
    CINEROAD - A Estrada do Cinema

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  8. Estava mesmo à espera que gostasses também! Excelente! :)

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