quinta-feira, 9 de setembro de 2010

O Segredo dos Seus Olhos, por Carlos Antunes

Título original: El Secreto de Sus OjosElenco: Soledad Villamil e Ricardo Darín

O Segredo dos Seus Olhos pareceu fazer figura de "ladrão" no que toca ao Oscar de Melhor Filme de Língua Estrangeira.
Mesmo não sendo o melhor filme do lote, é preciso admitir que a atribuição do Oscar faz todo o sentido por ser o filme que melhor recorda aquilo que o Cinema e a Indústria que atribui os prémios foram e deveriam ainda ser.


O Segredo dos Seus Olhos é um filme em contínuo, inteligente, sóbrio, clássico.
O se horizonte é o da história, de a contar o melhor possível tanto na sua forma narrativa como na sua forma cinematográfica.
O seu vínculo é para com as personagens e o reflexo que estas têm para a história, deixando que tudo flua.
A realização acompanha em harmonia os passos do que é necessário ver contado, nenhuma das partes domina a outra.
Avançando e recuando no tempo, o filme não se perde e o realizador-argumentista consegue trazer com inteligência os dois fios de história com que tem de jogar a um nó simples mas perfeito.
Trata-se da vitória da composição da obra sobre o desarranjo do espectáculo.


A calma com que o filme é dominado é o que lhe permite começar como a catárse da memória de um tempo irresolvido (amorosa e criminalmente) e, a qualquer momento, pisar terrenos distintos - que vão do melodrama ao noir - sem perder o seu foco e a sua solidez.
Seria injusto, por outro lado, não dizer que essa solidez também chega por força do talento das estrelas do filme, actores de talento imediatamente reconhecível - sobretudo um Ricardo Darín que é carismático e um líder de elenco natural - e que deixam traços claros do que as suas personagens são e de como chegaram de um ponto ao outro, vincando-o com subtileza.
São as personalidades dos seus personagens e a sua evolução temporal que ajudam a manter constante o fluxo que é este filme.
O universo fechado que o filme cria através de tudo isto apresenta-se sem rugas nas zonas onde tem, realmente, de se completar.


Um filme imune - porque indiferente - à etiquetagem dos géneros. Um filme construído em torno de uma soberba narrativa, sem nunca a constranger a qualquer ideia feita de necessidade cinematográfica. Um filme que conta com precisão uma história extraordinária.
Um filme que, a isso, adiciona um conjunto de actores muito bom e uma realização que vai para lá do meramente competente e que procura uma personalização do filme.
Um filme como Hollywood produzia há 60 ou 70 anos atrás com uma frequência inigualável, com a qualidade acima de todos os factores, com a competência como regra.
Não chego ao ponto de dizer que o filme é brilhante, mas é um luxo ainda encontrar filmes assim.



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