domingo, 24 de julho de 2011

American Splendor, por Carlos Antunes


Título original: American Splendor
Realização: Shari Springer Berman e Robert Pulcini
Argumento: Shari Springer Berman e Robert Pulcini
Elenco: Paul Giamatti, Harvey Pekar e Hope Davis

American Splendor é o retrato de Harvey Pekar, da sua obra de banda desenhada e, também, de uma certa década de 1970 mais underground que o habitual.
American Splendor é o nome da banda desenhada que Pekar escreve – e que muitos desenhadores da “contra-cultura” ilustraram, incluíndo Robert Crumb, sobre quem Terry Zwigoff assinou um documentário – sobre o preceito ” A vida banal é uma coisa complexa”.
Nas páginas da sua obra encontramos um homem comum, neurótico, amante de Jazz, leitor compulsivo e profundamente anti-social, integrado num círculo de desalinhados como ele próprio.
O facto de este homem ter dado origem a um filme parece confirmar a veracidade do seu próprio lema.
Biopic, adaptação de banda desenhada e documentário. Combinação inesperada e estranha, certamente mas surpreendente, sobretudo quando consegue ser concretizada com uma ousadia formal e não ceder em nenhum momento.
Por um lado, Paul Giamatti interpreta Harvey Pekar nas cenas de reconstituição da vida de Pekar; por outro, participações televisivas de Pekar e filmagens da sua vida actual; e por fim a existência desenhada de Pekar. Todas estas formas têm direito ao seu próprio tempo dentro do filme.
Mas eles não existem isoladamente mas antes invadem-se, minam-se, elevam-se mutuamente. E é aqui que o filme demonstra toda a sua ousadia, formal sim, mas sobretudo na forma como intensifica as noções que temos sobre Pekar dando espaço à intervenção do tema no próprio objecto, relativizando-o.
Essa mescla, essa influência é particularmente notória (e notável) quando Pekar e Giamatti partilham a cena para falar de Pekar, simultaneamente objectiva e subjectivamente, pois ambos são Pekar mas também ambos têm Pekar diante de si.
Nesse momento Pekar é simultaneamente pessoa e personagem e essa indecisão, essa subjectividade tornam-no mais palpável e perceptível.
Conseguir esse efeito, radicalizando a noção de documentário e biopic que temos é notável.


Publicado originalmente a 3 de Julho de 2007 e editado para publicação corrente

1 comentário:

  1. Muito bom! É sempre um prazer testemunhar o talento de Giamatti.

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