Título original: Um Filme Português
Realização: Levi Martins, Vitor Alves, Miguel Cipriano, Jorge Jácome, Vanessa Sousa Dias e Carlos Pereira
Elenco: António-Pedro Vasconcelos, João Botelho, João Lopes e Paulo Rocha
Este filme não é uma reflexão em seis partes mas mais um conjunto de seis reflexões orientadas pela sensibilidade dos seis realizadores que lhes deram corpo.
Essa talvez seja uma das características mais desafortunadas do filme, que não haja um sentido de discurso prolongado no qual cada realizador teria direito a um capítulo/tema.
Um dos seis realizadores deste projecto, escolhido como "porta voz" no início da sessão, disse mesmo que os vários segmentos eram complementares. Essa forma de apresentação pareceu preguiçosa pois o melhor dos vários segmentos são os seus momentos de claro confronto.
Confrontos vários mas que retornam (como não poderia deixar de ser) ao da identidade de um cinema local contra uma criação - e divulgação e distribuição - de cinema apesar do lugar onde se inscreve.
Talvez um dos confrontos mais interessantes nesse campo venha da coincidência de ter Saguenail a dar Odete (e Alice) como exemplo de um filme que pelos seus cenários urbanos incaracterísticos se poderia passar em qualquer cidade moderna e depois ter João Pedro Rodrigues a falar de um filme em que se dedicou a mostrar um cenário único como o do mercado de Macau e a afirmar que nunca afirmou que era representante de um Cinema Português.
Sem julgamentos de valor cinematográfico, Saguenail não deixava de evidenciar que a falta da inclusão geográfica nos filmes correntes lhes retiram a possibilidade de criação de uma identificação (e talvez de uma identidade) nacional, enquanto Rodrigues descobriu um ponto externo - embora com ligações a Portugal - como personagem de um dos seus filmes ao mesmo que no interior do país as suas histórias se chegavam tanto aos personagens humanos que escondiam os cenários.
Os outros confrontos que se encontram vêm sempre desta possibilidade de relacionar discursos de segmento para segmento, isto como tarefa do espectador.
Nesse aspecto é na minha óptica importante falar, também, do embate entre televisão e cinema.
No segmento inicial António-Pedro Vasconcelos afirma que ver um filme na televisão é ver uma reprodução útil mas insuficiente de uma obra de arte que só está no sei meio verdadeiro na tela. Mas diz também que é preciso trabalhar a ficção para a TV paralelamente ao que é feito para o Cinema.
Já no último segmento dois jovens realizadores, João Salaviza e Gabriel Abrantes, desmentem-no mas também se desmentem mutuamente. A visão de Salaviza é a de que o Cinema é o bastião que confronta a formatação da televisão enquanto Abrantes revela que inscreve a estrutura televisiva no seu cinema.
Estes moldes discursivos em confronto existem e deveriam os realizadores ter pensado na sua globalidade as relações dos mesmos.
Todos os testemunhos - mesmo se não na mesma medida - são plenos de inteligência e atenção ao ofício do Cinema. Nenhum é negligenciável e aí há que aplaudir as escolhas dos intervenientes e assinalar a diversidade das afinidades dos realizadores deste projecto.
Como há que elogiar a inteligência com que os realizadores seleccionaram e montaram os vários discursos, depurando-os sem lhes retirar conteúdo (ou assim nos fazem crer).
Na medida contrária, em torno dos testemunhos, os realizadores de Um Filme Português fecharam-se em torno dos seus segmentos individuais, não só negligenciando o discurso global como já referi, mas filmando cada um deles um conjunto de imagens em torno de ideias próprias mas, em muitos casos, dissonantes dos testemunhos do próprio segmento.
Em vários destes seis segmentos, os realizadores acabaram por colocar bastante ruído visual em torno dos testemunhos, não chegando a fazer com que eles se apaguem, mas certamente tornando as imagens num incomodativo ruído de fundo e cortando o tempo que melhor serviria a mais intervenientes ou, pelo menos, a mais tempo a cada um dos intervenientes escolhidos.
O caso de sentido inverso que mais fortemente deverá ser assinalado é o de Carlos Pereira que foi mais contudente no uso das iamgens em favor da ligação ao discurso.
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