segunda-feira, 30 de julho de 2012

Elena, por Tiago Ramos


Título original: Elena (2011)
Realização: Andrey Zvyagintsev
Argumento: Andrey Zvyagintsev e Oleg Negin
Elenco: Nadezhda Markina, Andrey Smirnov, Aleksey Rozin e Elena Lyadova

Chegamos ao fim e ficamos com a impressão que voltámos ao início. E não temos problemas com isso porque o que realmente interessa é o processo e como aqui chegámos ou regressámos. O que aqui interessa é a forma como o russo Andrev Zvyagintsev conduz Elena e o espectador de uma forma operática, repetitiva e constante, elegantemente rotineira. Um tic-tac constante, um quotidiano banal, uma sucessão de levantar, pentear, arranjar o pequeno-almoço, cuidar do marido, cuidar do filho, deitar, levantar, pentear. Tudo a um ritmo lento, mas simultaneamente muito natural. Um estilo que se sente sem se impor, porque é essa sucessão fria de eventos que ajuda à criação daquela Elena, uma mãe cujo sentido de responsabilidade e de defesa da família é superior a tudo. Uma interpretação soberba, das melhores do ano, vinda de Nadezhda Markina e cuja moralidade dos seus actos é difícil de questionar seriamente. Actos esses que são seriamente intensificados por aquele jogo da normalidade, entre cortinas a fechar, portas a correr, sacos na mão, uma seriedade que carrega no rosto, tudo sonoramente marcado pelo trabalho na banda sonora Philip Glass que concentra grande parte da atmosfera ali naquele compasso constante. Compasso no qual também o cineasta trabalha, a par da atmosfera dramaticamente portentosa captada pela direcção de fotografia de Mikhail Krichman, ao concentrar tudo naquele carácter sócio-político e no rosto das personagens, mais em Elena, num impacto assombroso, mesmo quando tudo pareça apenas um anti-clímax.

A bomba que não rebenta é a que mais estragos provoca. Porque quando chegamos ao fim aquilo que vemos é a mesma incerteza do futuro que pairava no ar desde o início. O mesmo olhar sofrido e desinspirado do mundo e aquela ambiguidade da personagem de Elena que persiste desde o início. E aqueles dois planos finais que pairam a ameaça, nem sabemos muito bem de quê, exploram e continuam o dilema do espectador e das personagens. Não há bom nem mau ali, nem sabemos bem se existe um meio caminho, um cinzento. O trabalho de Andrev Zvyagintsev é bem maior que essas fronteiras planas e distintas. O sentimento de culpa existe, não sabemos bem se existe um castigo. Mas haverá maior castigo do que aquele que paira no ar?


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