segunda-feira, 9 de julho de 2012

Moonrise Kingdom, por Tiago Ramos


Título original: Moonrise Kingdom (2012)
Realização: Wes Anderson
Argumento: Wes Anderson e Roman Coppola
Elenco: Jared Gilman, Kara Hayward, Bruce Willis, Edward Norton, Bill Murray, Frances McDormand, Tilda Swinton e Harvey Keitel

Estamos perante, com certeza, um filme de memórias. Um filme que se alimenta das recordações dos seus autores (Wes Anderson e Roman Coppola), mas que vive também das próprias memórias de infância do seu espectador. E ao centrar-se em dois desajustados e problemáticos (pelo menos à vista da sociedade) está também a ganhar pontos de identificação com os espectadores - quem em criança e adolescente não se sentiu fora do seu ambiente, marginal, desadaptado? Um sentimento que Wes Anderson vai construindo e transmitindo gradualmente, como quem constrói aquela família e aquela história como quem compõe uma peça, como quem organiza uma orquestra. Daí que a cena inicial de Moonrise Kingdom (que depois repete a brincadeira já nos créditos finais, pelo que devem ficar atentos) é tudo menos inofensiva. Aqueles instrumentos musicais que gradualmente vão compondo aquele tema musical, são também eles os membros daquela família que se vai compondo perante os nossos olhos, à medida que a câmara de Wes Anderson vai, de forma tão suave e rica, mostrando aquela casa de uma forma tão plástica como real (e que soa tanto ao estilo usado curiosamente no seu filme de animação, Fantastic Mr. Fox). Daí que essa componente artificial não deixa esconder a visão da história do filme como uma fábula. Uma fábula dos inadaptados, da ingenuidade da infância e sobretudo do amor (e não só do primeiro amor, mas também da sua falta, como do seu próprio fim - não esquecer aquele magnífico plano em que as personagens de Frances McDormand e Bill Murray falam das dores do seu (extinto?) amor).

Wes Anderson continua fiel ao seu estilo, mas arriscamos dizer que em Moonrise Kingdom atinge a sua consistência perfeita tanto a nível estético como a nível do argumento tão ricamente construído. À medida que vai construindo aquele mundo tão gráfico e tão artificial, quase caricatural, vai também reflectindo um microcosmos do mundo real (onde existe ataque à não-normalidade e não correspondência dos padrões da sociedade), como simultaneamente, um último resquício da imaturidade, ingenuidade e infantilidade de cada um de nós. A nível técnico, é assombroso, com destaque para a fotografia de Robert D. Yeoman de cores fortes e saturadas, de tons ferrugem, passando pela magnífica banda sonora de Alexandre Desplat (tão delicadamente composta como o argumento do filme) e pela direcção artística de Gerald Sullivan. Os planos cuidadosamente orquestrados de Wes Anderson confirmam-no como um dos melhores cineastas da actualidade, com uma visão muito própria do seu estilo e com uma coerência invejável para qualquer outro. Um cineasta coerente que sabe rodear-se de actores únicos, mas o destaque de Moonrise Kingdom vai para a descoberta que são os jovens Jared Gilman e Kara Hayward que dão à história toda a inteligência, subtileza e ingenuidade necessárias.

Em Moonrise Kingdom há, para além de toda a coerência e inteligência na orquestração de tudo o que compõe a história, sobretudo sentimento e coração. Um filme de memórias, um filme de infância, sobre o coming of age, sobre o primeiro amor, sobre a família. Uma espécie de Terra do Nunca real onde o espectador certamente saberá que já viveu.


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1 comentário:

  1. Ou uma terra imaginária que nunca vamos encontrar mas que andaremos (crianças ou adultos) à procura ... Excelente!

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