sexta-feira, 2 de novembro de 2012

César Deve Morrer, por Tiago Ramos


Título original: Cesare Deve Morire (2012)
RealizaçãoPaolo Taviani e Vittorio Taviani
Argumento: Paolo Taviani e Vittorio Taviani
Elenco: Cosimo RegaSalvatore StrianoGiovanni ArcuriAntonio FrascaJuan Dario BonettiVincenzo GalloRosario Majorana e Francesco De Masi

César Deve Morrer já chegava a Portugal sob o estigma (pelo menos o meu, admito) de ter sido o filme que poderia ter ocupado o lugar de Tabu na conquista pelo Urso de Ouro no Festival de Berlim 2012. Galardões esses que sabemos nós, que nem sempre são mais ou menos justas, dependendo de muitos outros factores alheios ao filme em sim, como a política ou reconhecimento de cineastas queridos. Merecendo ou não essa distinção - e nem é isso que está (ou deve estar) em causa - a verdade é que este último trabalho dos irmãos italianos Paolo e Vittorio Taviani é um honroso filme. A ver esta curiosa e ténue distinção entre ficção e documentário que nos chega na história da encenação da clássica peça Julio Cesar, de William Shakespeare, por prisioneiros de um presídio de segurança máxima em Roma, com nenhuma experiência teatral. Curiosamente um trabalho em muito semelhante à produção portuguesa documental Jesus por Um Dia, de Verónica Castro e Helena Inverno, vencedora do Prémio de Melhor Longa-Metragem Portuguesa no IndieLisboa 2012. Ambos os filmes - embora distintos na forma em como um é demarcadamente documental e o outro se funde entre géneros - giram em torno da ideia da interpretação teatral como catarse e redenção dos pecados. O que interessa em César Deve Morrer é precisamente a forma como cada um dos prisioneiros reinterpreta a sua personagem, dando-lhe subtilezas da sua própria vivência e e de figuras contemporâneas, mas fundindo-se com esta e diluindo-se entre a sua problemática existencial e a da própria personagem.

Não é uma ideia necessariamente original, esta do teatro filmado, mas também não precisava. Com recursos restritos, mas uma fotografia e montagem cuidadas de Simone Zampagani e Roberto Perpignani, respectivamente, o trabalho dos Taviani valoriza a intenção, atribuindo grande sensibilidade a um exercício que poderia ser meramente curioso. As palavras de Shakespeare, adaptadas ao contexto, ganham uma outra vida e sentido que os cineastas souberam aproveitar. E assim o filme está repleto de momentos em que o teatro e a vida parecem simultaneamente tão distintos quanto semelhantes e onde a desconstrução é tão grande que mesmo nós, os espectadores, nem sempre sabemos bem do que se trata. Ficção ou realidade, documentário ou teatro, encenação ou não, o que vemos em César Deve Morrer são aqueles rostos, aquela humanidade, naqueles homens que logo na cena inicial declamam a sua vida em meros registos auto-biográficos.


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1 comentário:

  1. Assisti no Festival do Rio deste ano e gostei muito. Os irmãos Taviani mais uma vez mostrando porque fazem parte da realeza do cinema italiano. Parabéns pela crítica Tiago. Abraços cinéfilos!

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