terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Holy Motors, por Tiago Ramos


Título original: Holy Motors (2012)
Realização: Leos Carax
Argumento: Leos Carax
Elenco: Denis LavantEdith ScobEva MendesKylie MinogueMichel Piccoli e Leos Carax

Não há nada para definir em Holy Motors e a sua interpretação dependerá do seu espectador. Quereria mesmo Leos Carax que o interpretassem ou queria desafiar apenas as tendências da sobre-análise e transpor as barreiras da narrativa? Nos minutos iniciais depressa percebemos que, a existir uma intenção clara, era a de tirar o espectador do seu conforto: num curioso exercício metalinguístico, vemos o próprio cineasta a enfrentar uma plateia apática (que dorme? está morta?). O seu tema é a alienação e Denis Lavant - num magnífico tour de force - é o actor que se transfigura (literalmente) em personagens distintas em momentos mais ou menos episódicos. No seu carácter operático, divide-se em momentos dramáticos, cómicos, surpreendentes ou emocionantes, bizarros ou reflexivos, com um único homem a transformar-se em vários outros - homens ou mulheres, seres sociais ou anti-sociais - dentro de uma limusina que, é na verdade, um camarim, desafiando as convenções do cinema e, em última instância, da própria vida.

A viagem (ou viagens) é anárquica e surreal, irreverente, insana e livre, diversificada como as personas que o Monsieur Oscar vive, como se fossem suas (e são suas? são nossas?). É episódica, como aquelas vidas: aquela velha senhora pedinte, aquele monstro dos esgotos (recuperado do segmento Merde de Tokyo!) com uma super-modelo interpretada por uma excelente Eva Mendes ou dois amantes num musical (momento perfeitamente delicado e surpreendente com Kylie Minogue) ou aquele actor/dançarino numa performance erótica em motion capture. As vidas sucedem-se e a viagem por Paris revela-se um labirinto de interpretações e bizarrias, que fornecem também um olhar pela evolução do cinema (não existisse também uma bela evocação de Les yeux sans visage). O resultado é uma experiência extasiante, contaminante, louca e repleta de adrenalina, divertida e obsessiva. Porque faz Leos Carax uma obra assim tão original e irreverente depende da interpretação de cada um, mas Monsier Oscar lança a pista: «Je continue comme j'ai commencé, pour la beauté du geste». E um cinema assim tão bonito e livre não é de se desperdiçar.


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