sábado, 6 de abril de 2013

O Profundo Mar Azul, por Tiago Ramos


Título original: The Deep Blue Sea (2011)
Há uma certa rigidez e formalismo no cinema de Terence Davies que é simultaneamente o que contém de melhor e pior. É a grosso modo uma identidade muito enraizada na teatralidade e que faz com que, para o bem e para o mal, apenas a espaços longos tenhamos oportunidade de ver uma película sua no cinema. É também por isso evidente que nesta adaptação cinematográfica da peça de teatro homónima assistamos a esse rigor do teatro, tanto nos tempos da narrativa, como no acentuado detalhe dos cenários e na presença da música. O que torna tudo muito paradoxal: a sua força é também a sua fraqueza. Aqui a estilização é bela e poética, numa mise-en-scène segura e visualmente primorosa, com acentuação na direcção de fotografia de tons escuros, uma severidade bem-vinda na direcção artística e até um detalhe sonoro que faz a diferença. Essa mesma austeridade técnica contribui para o crescimento da narrativa e um olhar atento sobre a psique humana, mesmo que assente em personagens-arquétipo, como da mulher conformada, mas com desejos secretos. Tudo isso num tom acentuadamente melancólico e soturno, uma tendência depressiva que chega até a ser impressionante, mas que por vezes culmina numa sensação de constante arrastamento e até de algum excesso de pompa, chamemos-lhe assim. Esse excesso é por exemplo notado na utilização da banda sonora, praticamente omnipresente logo desde a cena inicial e que tem o condão de marcar em demasia a sua presença, por vezes quase massacrante.

Da mesma forma convém sublinhar que o cinema de Terence Davies é também ele raro, o que faz deste O Profundo Mar Azul um singular objecto cinematográfico, de sua intensidade operática, com um elevado grau de lirismo que lhe chega até a assentar bem. Mas se isso é também por vezes excessivo, o que marca realmente a diferença são as escolhas de elenco, a destacar sobretudo a presença de Rachel Weisz (que o cineasta nem conhecia antes de a ter visto na televisão e ter perguntado quem ela era) e que tem aqui seguramente uma das melhores interpretações da sua carreira. A intensidade do seu assombroso e marcante desempenho é o que toma de assalto grande parte das cenas, com uma construção e complexidade de personagem invejáveis até para actores de maior currículo. É ela que faz valer o texto e que engrandece o trabalho do realizador, marcando a diferença num filme que em outras mãos seria completamente distinto. Também isso, para o bem e para o mal.


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