Realização: Jean-Pierre Dardenne, Luc Dardenne
Argumento: Jean-Pierre Dardenne, Luc Dardenne
Elenco: Marion Cotillard, Fabrizio Rongione
Que Marion Cotillard era uma excelente actriz já todos o sabíamos. Uma das mais completas e que oscila facilmente entre registos e personagens, um camaleão perante diferentes desafios e cineastas. Mas aquilo que ainda não tínhamos visto completamente (talvez o mais aproximado tenha sido em De rouille et d'os) era esta proeza que os irmãos Dardenne conseguiram: despir a actriz do seu estatuto de estrela. Aqui recuperam o seu realismo social sempre focado num tour de force do seu protagonista, mas aqui reduzem-nos ainda mais ao essencial. O contexto sócio-económico é facilmente enquadrado, o leitmotiv é dado logo nos minutos iniciais: Sandra será despedida da fábrica onde trabalha se não conseguir convencer os seus colegas a recusar um bónus salarial. A gravidade da situação económica é percebida pela estrutura familiar e como este evento afecta drasticamente a sua personagem principal. A câmara não se coíbe de filmar os pequenos momentos quotidianos que marcam a diferença: o saco do Lidl, a compra de um pão na padaria, o preço das cervejas, as viagens de autocarro. Sinais da actualidade do tema, do extremo realismo da situação e da conotação política que os cineastas gostam de lhe imprimir.
Ainda assim e se bem que o trabalho da dupla é por demais evidente e coerente com os seus anteriores trabalhos, o filme é sobretudo o desempenho de Marion Cotillard. A narrativa ganha um contorno sequencial, linear, mas praticamente episódico: em dois dias e uma noite, a personagem percorre todos os trabalhadores da fábrica como forma de luta pelo seu posto de trabalho. Uma situação perversa e moralmente controversa: como convencer pessoas que vivem no limite a abdicar de um bónus que lhes permitirá viver ligeiramente melhor em favor do teu próprio posto de trabalho? A câmara dos Dardenne segue Sandra frenética e desesperadamente numa odisseia contemporânea de sobrevivência a uma crise económica e de valores. Uma mulher que nem em si acredita, que viveu uma depressão, que está novamente à beira de outra (pudera) e que sofre também e precisamente desse estigma de mulher incapaz perante o seu empregador e alguns colegas. Um perigoso pensamento, mas com que o espectador facilmente se identificará sem qualquer problema numa sociedade vítima das novas noções de escravatura e perseguição em busca de uma qualquer eficiência empresarial.
A Sandra de Marion Cotillard é uma das mais belas composições dos últimos anos e que se mescla perfeitamente com a narrativa dos Dardenne. O filme é ela, aquele ímpeto meio desencorajado, no fio da navalha, aquele sprint final do desespero, mas ainda aqueles valores morais de quem tenta recuperar o seu trabalho - porém, não a todo o custo. É por isso que apesar de moral (nunca moralista) e extremamente austero, Dois Dias, Uma Noite consegue ser profundamente emocional e comovente. É pungente e marcante, sobretudo por ser tão real, por ser a nossa vida.
Que Marion Cotillard era uma excelente actriz já todos o sabíamos. Uma das mais completas e que oscila facilmente entre registos e personagens, um camaleão perante diferentes desafios e cineastas. Mas aquilo que ainda não tínhamos visto completamente (talvez o mais aproximado tenha sido em De rouille et d'os) era esta proeza que os irmãos Dardenne conseguiram: despir a actriz do seu estatuto de estrela. Aqui recuperam o seu realismo social sempre focado num tour de force do seu protagonista, mas aqui reduzem-nos ainda mais ao essencial. O contexto sócio-económico é facilmente enquadrado, o leitmotiv é dado logo nos minutos iniciais: Sandra será despedida da fábrica onde trabalha se não conseguir convencer os seus colegas a recusar um bónus salarial. A gravidade da situação económica é percebida pela estrutura familiar e como este evento afecta drasticamente a sua personagem principal. A câmara não se coíbe de filmar os pequenos momentos quotidianos que marcam a diferença: o saco do Lidl, a compra de um pão na padaria, o preço das cervejas, as viagens de autocarro. Sinais da actualidade do tema, do extremo realismo da situação e da conotação política que os cineastas gostam de lhe imprimir.
Ainda assim e se bem que o trabalho da dupla é por demais evidente e coerente com os seus anteriores trabalhos, o filme é sobretudo o desempenho de Marion Cotillard. A narrativa ganha um contorno sequencial, linear, mas praticamente episódico: em dois dias e uma noite, a personagem percorre todos os trabalhadores da fábrica como forma de luta pelo seu posto de trabalho. Uma situação perversa e moralmente controversa: como convencer pessoas que vivem no limite a abdicar de um bónus que lhes permitirá viver ligeiramente melhor em favor do teu próprio posto de trabalho? A câmara dos Dardenne segue Sandra frenética e desesperadamente numa odisseia contemporânea de sobrevivência a uma crise económica e de valores. Uma mulher que nem em si acredita, que viveu uma depressão, que está novamente à beira de outra (pudera) e que sofre também e precisamente desse estigma de mulher incapaz perante o seu empregador e alguns colegas. Um perigoso pensamento, mas com que o espectador facilmente se identificará sem qualquer problema numa sociedade vítima das novas noções de escravatura e perseguição em busca de uma qualquer eficiência empresarial.
A Sandra de Marion Cotillard é uma das mais belas composições dos últimos anos e que se mescla perfeitamente com a narrativa dos Dardenne. O filme é ela, aquele ímpeto meio desencorajado, no fio da navalha, aquele sprint final do desespero, mas ainda aqueles valores morais de quem tenta recuperar o seu trabalho - porém, não a todo o custo. É por isso que apesar de moral (nunca moralista) e extremamente austero, Dois Dias, Uma Noite consegue ser profundamente emocional e comovente. É pungente e marcante, sobretudo por ser tão real, por ser a nossa vida.
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