Por Joaquim da Silva.
«Tears Dry on Their Own»
São muitos anos. É crescer e aprender. Mais vale tarde do que nunca.
Quando crianças, todos queremos ser adolescentes. E depois temos
pressa de ser adultos. E depois, temos saudades de ser adolescentes
outra vez. Mas ninguém anseia ser velho. Idoso. Reformado.
Há muito mais quem procure a juventude eterna do que a tranquilidade
da velhice. Desde sempre se procura incessantemente a imortalidade.
A persistência da luta contra o tempo, da falta de tempo, da resistência
à passagem dos dias, dos meses, dos anos, o desespero do reflexo
enrugado, da erosão da beleza jovial. Ninguém é velho - velhos
são os trapos, a idade é um estado de espírito - ser velho é algo
semi-repugnante, rejeitado por todos (inclusive os velhos).
Pois cabe-me dizer:
Caríssimos, todos envelhecemos. Todos os que tiverem a sorte de
viver mais que o seu igual serão inevitavelmente velhos.
E como tudo o que é inevitável, eis que vem o habituar. Habituemo-nos
à ideia, conforme é esperado.
E quando não mais se pode esperar?
Grace and Frankie parte da premissa simples de que em 2015 é relativamente
bem aceite e bem mais fácil sair do armário. Ser-se quem se é,
é uma condição bem mais alcançável hoje do que há alguns - nem assim tantos - anos.
Pois então Robert (Martin Sheen) e Sol (Sam Waterston), cônjuges das respectivas personagens titulares,
também o sabem. E decidem que é hora de dizer a verdade, romper
com os seus casamentos heterossexuais e assumir
a paixão que os leva a manter uma relação secreta.
Pedem o divórcio e decidem juntar-se. Ora, todos os dias isto deve
acontecer em qualquer lado, até que é mais comum haver divórcios do
que casamentos.
Detalhe: todos eles enquadram-se na faixa etária 65+.
Essa idade em que tudo está já designado, a vida é feita de conformes e de
hábitos, de um desenrolar de rotinas na lenta espera pela morte.
Na mais requintada ironia, Grace (Jane Fonda) e Frankie (Lily Tomlin) são duas personalidades
opostas: uma conservadora, que segue altos padrões de moral, ética e
etiqueta, frequentadora dos melhores e mais altos níveis sociais, filantrópica
e empreendedora.
A outra, liberal, libertina, professora de arte de ex-reclusos, que nega
algumas das convenções sociais mais antigas, progressista à frente
do seu tempo. Veja-se, Frankie é mãe adoptiva de dois
homens de raças diferentes, tendo-o feito numa presumível época em que a
raça negra ainda era fortemente discriminada nos Estados Unidos.
Como se o destruir das suas vidas matrimoniais não fosse um evento suficientemente traumático, ambas se refugiam na partilhada casa de praia dos
casais (Robert e Sol são sócios de trabalho, pelo que existe uma relação
anterior ao início da série entre Grace e Frankie).
E é aqui que se inicia o processo de superação de duas mulheres,
que nada mais têm que a si mesmas, uma à outra, e aos filhos,
para viver algo que se vive aos 30 ou 40 anos de idade.
Grace and Frankie lida com os problemas dos "jovens" da perspectiva dos
"séniores": orientação sexual, aceitação social, reconstrução da vida amorosa,
luto pela relação falhada, (re)inserção no mercado laboral.
Grace and Frankie é uma comédia de relações, amores e desamores,
absolutamente igual a tantas outras.
Só que em vez de falar de jovens, ou de jovens adultos, fala de seres humanos.
Porque os velhos são seres humanos também, e o amor não escolhe idades.
Morrer é parar, seja isso em que idade for.
P.S.: Brianna (June Diane Raphael), hilariante em todas as linhas de diálogo que tem. Mais foco e desenvolvimento
desta personagem precisa-se, aligeira os momentos dramáticos mas não desvia a atenção
do espectador do foco da trama.
Robert, pelo contrário, é desinteressante e acessório, não faz diferença quase nenhuma,
só serve para que as personagens principais iniciem a sua jornada em igualdade de circunstâncias.
Grace and Frankie (2015)
Netflix
Temporada 1
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