quarta-feira, 31 de julho de 2019

Velocidade Furiosa: Hobbs & Shaw, por Eduardo Antunes

https://splitscreen-blog.blogspot.com/2019/07/velocidade-furiosa-hobbs-shaw-por.html

Título originalFast & Furious Presents: Hobbs & Shaw (2019)
RealizaçãoDavid Leitch
ArgumentoChris MorganDrew Pearce

A excentricidade nas sequências de acção de hoje em dia, aparentemente necessária para pedir a atenção do público, cada vez deixa menos margem de manobra para alguma inventividade nas mesmas, caindo num espectáculo de efeitos especiais que, muitas das vezes, parecem inacabados e quebram a possível imersão nessa realidade, mesmo que exagerada. E nem uma dinâmica entre personalidades de bom calibre salva a falta de controlo que claramente falha ao realizador nas sequências de grande escala deste filme.

The Fast & The Furious tinha uma premissa básica que não deixava grande margem para fazer sequelas. No entanto, na "necessidade" de as fazer, apenas ao quinto título houve realmente uma separação da ideia original para possibilitar maior imaginatividade na acção narrativa e motorizada. Uma particular sequência final vem sempre à cabeça quando pensamos no momento em que a série ganhou um novo ímpeto, consciente da sua própria realidade exagerada que, ainda assim, demonstrava uma noção de como filmar boa acção.

Nas sequelas seguintes, face alguma falta de ideias, sentiram a necessidade de aumentar cada vez mais o que estava em jogo, tornando o bando de protagonistas criminosos em autênticos heróis, parte agora de uma equipa de espiões. Tudo isso faz com que esta série cada vez mais se assemelhe a uma outra, que também ganhou um renovado fôlego ao longo dos últimos anos.

Mas se em Mission: Impossible, inconsistente como série, a visão de cada realizador permitiu um enfoque personalizado a cada filme, Fast & Furious não o tem, não abraçando completamente o ridículo de uma equipa de ladrões que salva o mundo. Isso não é mais patente que em The Fate of the Furious, em que o entretido ponto alto do filme, no salvamento de um bebé às mãos de Statham num avião, não coadunava com uma estória e interpretação de Vin Diesel demasiado sérias. Aspectos claramente não pertencentes ao mesmo filme.

Não é, portanto, de admirar que, face o sucesso exponencial de Johson e o carisma e comédia demonstrada por Statham, eventualmente focassem um filme no seu par. No entanto, também se vê aqui a limitação dessa junção que, apesar de nos divertirem sempre que aparecem em ecrã em conjunto (muito pelos próprios actores), as suas interacções não passam de uma repetição de ofensas e ameaças gratuitas entre os dois, numa renitente junção que já tinha sido resolvida anteriormente mas que, para efeitos cómicos e narrativos foi trazida de volta, para demonstração da construção da sua camaradagem.



(In)felizmente, este é ainda assim o ponto que mais facilmente nos vende este filme. Porque se antes as sequências da acção se tornavam o ponto principal de venda, com uma estória muitas vezes complicada e imemorável, aqui a narrativa é já propositadamente básica, para não largar esse foco. No entanto, esses pontos tornaram-se também imemoráveis, numa catadupa de sequências cada vez mais excêntricas sem que nenhuma se destaque ou consiga se aproximar sequer do roubo sob rodas que finalizava de forma climática Fast Five.

David Leitch, na sua contribuição em John Wick e com Atomic Blonde, demonstrou a sua facilidade em lidar com sequências de luta corpo a corpo, que aqui volta a demonstrar numa sequência em que Statham enfrenta uma série de guardas num corredor. Mas em Deadpool 2 já demonstrava a falta de tacto em alguma sequências de maior escala, e que aqui é patente em qualquer sequência em que veículos estejam envolvidos.
Podemos até voltar a tecer comparações  com Missão: Impossível, já que até o argumento se assemelha ao de M:I-2, incluindo uma personagem feminina que se inocula com um vírus para impedir que caia nas mãos do antagonista. Mas as cenas de acção aqui em nada se assemelham às dessa série por, na sua constante subida da parada, manterem um nível de imersão na acção que se passa no ecrã, muito devido a Tom Cruise submeter-se aos desafios cada vez maiores e a realizar as acrobacias de verdade, numa prova de que essas são mais emocionantes que qualquer utilização de efeitos digitais.

E se no final, depois de uma perseguição numa fábrica abandonada, em que é clara a colagem dos actores num cenário totalmente falso, a promessa de voltar a uma luta mais palpável parecia contrariar e subverter as expectativas de uma cena final "em grande", logo de seguida é-nos dada a cena mais inacreditável, em que Hobbs aguenta um helicóptero por uma corrente, enquanto se agarra ao carro que o transporta.
É inclusivemente irónico assistir a entrevistas em que Statham refere o seu descontentamento generalizado com essas sequências de excentricidade, submetendo-se no entanto ao filme em que provavelmente terá menos para ele próprio fazer.

Ainda que entenda o tom suposto e pedido, este subproduto de Velocidade Furiosa não se consegue destacar, nem da restante série, nem dos seus filmes de acção contemporâneos. Se os actores não falham, incluindo Vanessa Kirby a quem é dado um papel equiparável ao duo principal, nada lhes é dado para se destacarem de outras ideias semelhantes, caindo em lugares comuns sem carácter particular. Continua, assim, uma ideia de que o público generalizado é capaz de engolir filmes de acção sem subtileza ou inteligência, tentando vender um produto vazio com base no nome da série e do talento envolvido.


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