sexta-feira, 6 de maio de 2011

Homme au bain, por Tiago Ramos



Título original: Homme au bain (2010)
Realização: Christophe Honoré
Argumento: Christophe Honoré
Estamos provavelmente perante um dos mais interessantes objectos fílmicos que Christophe Honoré já nos entregou. Se pelo arrojo de utilizar François Sagat, actor pornográfico gay e fantasia sexual de muitos homens, como protagonista, pela irreverência da desconstrução da figura masculina ou pelo facto de o seu filme completo ser na verdade constituído por dois filmes menores, não sabemos. O cineasta francês sabe como poucos representar a sexualidade no cinema e especialmente as relações humanas. Provavelmente a visão sexual que vimos em Ma Mère (2004) é ainda mais arrojada que em Homme au Bain, mas este último tem em si, especialmente para a crítica e público em geral, o factor choque da figura porno como principal veículo de promoção.



Contudo, perante as perspectivas baseadas em conceitos pré-concebidos, Christophe Honoré actua no sentido de as subverter, ignorando o espectador e indo de encontro aquilo que não esperava: um protagonista trágico, sensível e frágil como nunca se especulou que François Sagat pudesse ser. O seu corpo é cliché sexual, como imagem da virilidade, uma figura física estilizada e semelhante ao padrão escultural. Mas ao focar-se na sua figura em meio ao término da sua relação com um jovem realizador, revela um ser humano vulnerável e sensível durante o seu processo de transformação. É como é referido numa cena onde o corpo nu de Emmanuel (a sua personagem) é comparado a uma má peça de arte, uma obra kitsch, sem densidade e cujo interesse se perde após mais de um visionamento. É o estigma do corpo como objecto com que o cineasta joga para depois nos lançar no oposto e encontrarmos uma personagem densa.

Homme au Bain é na realidade duas narrativas complementadas. Inicialmente pensado para curta-metragem nos subúrbios de Gennevilliers com François Sagat, os cerca de quarenta minutos filmados fizeram Christophe Honoré pensar que talvez tivesse material interessante o suficiente para criar uma longa-metragem. A solução foi complementar com uma narrativa filmada em formato vídeo digital aquando da viagem do cineasta a Nova Iorque para a promoção do seu filme anterior com Chiara Mastroianni, Non ma fille, tu n’iras pas danser (2009). Em Homme au Bain é a visão do namorado em fuga por Nova Iorque.



Essa divisão de cidades, entre os subúrbios de Paris e a cosmopolita Nova Iorque, recria uma naturalidade e realismo muito interessantes dentro da filmografia de Christophe Honoré. Ambos são vistos através da sensualidade e erotismo, mas também na intimidade, daí que a cena que dá título ao filme – Emmanuel que se seca após o banho, cujas pegadas húmidas se destacam no chão seco – é fiel na recriação da visão ternurenta de um homem, viril na sua aparência, mas vulnerável no seu âmago. É um misto de drama e documentário, extremamente real, uma ânsia de querer ultrapassar o físico e partir para o emocional, em meio a solidão

Homme au Bain, arrisco-me a dizer, é uma das mais completas obras de Christophe Honoré, pela sua genial desconstrução, naturalidade e intimidade. É um filme imperfeito como nunca tínhamos visto nas suas mãos. É sobretudo uma maneira de filmar livre de um cineasta que parece ter-se libertado dos padrões e filmado por puro gosto e prazer. É um filme angustiante e trágico, sensível e sensual, mas sobretudo íntimo. É um homem no banho, desprotegido.



Classificação:

1 comentário:

  1. Por acaso considero que este filme ficaria bem mais interessante se a parte de nova Iorque fosse suprimida, vejo-o mais como uma tentativa de promover François Sagat do que uma tentativa de fazer um filme.

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