segunda-feira, 26 de setembro de 2011

We Were Here, por Carlos Antunes


Título original: We Were Here
Realização: David Weissman e Bill Weber
Elenco: Ed Wolf, Paul Boneberg e Daniel Goldstein

We Were Here é um documentário formalmente muito pouco distinto de tantos outros documentários, feitos para cinema ou mesmo televisão.
A estrutura de relato cronológico por meio de entrevistas - aqui e ali pontuado com material da época - é inversamente atraente para o público ao que é prático para os realizadores.
Mesmo assim o filme destaca-se dessas peças de formalismo limitado e a razão para tal é o percurso objectivo traçado pelos realizadores que não despreza as emoções necessárias ao cinema.
Ao escolher um grupo de cinco "sobreviventes" ao surgimento da epidemia da SIDA em São Francisco que tiveram perspectivas priveligiadas e complementares dos eventos daquela época.
Estiveram todos no centro do que acontecia, mas diferiam em orientação sexual, na forma de envolvimento, na motivação para agirem e no grau de entrosamento com a comunidade homossexual. Daí que, tanto pela visão de cada um como pelas noções de que partem, o documentário seja lúcido e não acabe contaminado com uma presença visível de um discurso dos realizadores.
Talvez o mais notável do filme seja a forma como os realizadores recuperaram um modelo de documentário que continua a ser comum mas que tem perdido a consideração dos cinéfilos perante trabalhos mais criativos. E recuperaram-no, não só de forma a manterem a característica principal de um documentário, mas de forma a explorarem a questão humana individual no seio da imagem maior que estão a filmar.
A seriedade objectiva do filme vem da sua forma que acaba por deixar que os próprios intervenientes revelem as suas emoções sem ser necessário montar uma narrativa que explora (de forma oportunista) esses mesmos intervenientes.
À medida que contam a história, os cinco intervenientes deixam vir à tona o sofrimento que tomou conta deles e que ainda ressurge.
A história, já de si pouco agradável de suportar ou não houvessem comparações da calamidade aos campos de concentração nazis, torna-se ainda mais intensa no coração do público quando a objectividade não se desvia dos soluços choramingosos. Porque a dureza daquele período pode entender-se contada mas só se pode sentir vista e isso é que o documentário tem para dar ao público.
Mais do que o tema da SIDA, o filme é um poderoso retrato do abismo a que pode ser submetida uma comunidade e a força que ela encontra para preservar a sua própria humanidade. Um retrato feito por uma mão cheia dos que resistiram até hoje mas que perderam um número incontável de amantes, amigos e conhecidos.





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