sábado, 19 de setembro de 2009

Em Carne Viva, por Tiago Ramos



Título original: Carne trémula (1997)
Realização: Pedro Almodóvar
Argumento: Pedro Almodóvar e Jorge Guerricaechevarría
Elenco: Javier Bardem, Francesca Neri, Liberto Rabal, Ángela Molina, José Sancho, Penélope Cruz e Pilar Bardem

Ao pôr de lado todos os seus tiques e maneirismos de realizador, Pedro Almodóvar encontrou um estilo que lhe assenta bastante bem: o thriller. Claramente o seu filme com mais referências políticas, o cineasta situa a obra durante o regime repressivo de Franco até aos dias de hoje.



Esta obra marcou a maturidade do realizador, através de um drama intenso e sensual (um dos mais erotizados), sempre crítico à máquina americana, mas ao mesmo tempo fazendo de Em Carne Viva um dos seus filmes mais internacionais. O realizador utiliza um extenso product-placement e uma co-produção francesa que ajuda à internacionalização, mas também recorre a novos recursos tecnológicos como o som digital e o formato CinemaScope, da Panavision.

Em Carne Viva revela-se um corajoso e realista ensaio sobre Amor, Ódio, Vingança, Desespero e Atracção Física. Mas sobretudo a nível da construção das personagens, Pedro Almodóvar revela-se um grande argumentista que adora desconstruir clichés. E aí, a dada altura, o espectador não sabe realmente que sentimento nutrir por cada uma das personagens, que estão em constante choque consigo mesmos e que se revelam a eles próprios primeiro que aos espectadores.



Destaque o grande trabalho do elenco, que trabalha em plena sintonia, especialmente um talentoso mais ainda em estado bruto, Javier Bardem; a italiana Francesa Neri, o jovem Liberto Rabal ou Ângela Molina, que volta a colaborar com o realizador em Los Abrazos Rotos. Essa excelente direcção de actores permite a Pedro Almodóvar garantir um caminho seguro e pouco usual na sua carreira, mas sem nunca deixar de incluir situações caricatas (como aquele em que a personagem da ainda jovem Penélope Cruz dá à luz num autocarro, dando o mote para todo o filme) ou a sua perspectiva crítica iniciada e concluída no mesmo espaço físico, no Natal, mas com uma grande diferença em termos políticos. Esta inteligente linha temporal permite que se mostrem as coincidências de um acontecimento, mas que acabam sempre por ser as escolhas de cada um que definirão o destino das personagens.

Uma das películas mais inteligentes, vibrantes, sensuais, com um belo trabalho fotográfico de Affonso Beato, que já trabalhou com o cineasta espanhol em La flor de mi secreto (1995) e Todo sobre mi madre (1999). Pedro Almodóvar aproveita todo este tom para substituir o seu humor cínico e divertido por algo mais nervoso e irónico, conseguindo perturbar mas ser poético simultaneamente.



Em Carne Viva revela uma das facetas mais escondidas do realizador, mas que melhor lhe assenta, numa película inspirada e inspiradora.

Classificação:





2 comentários:

  1. Ainda não consegui escrever a crítica a este filme, está para breve, mas é sem dúvida um dos melhores de Almodóvar! Concordo com a tua crítica e quando dizes que o realizador é especialista em desconstruir clichés.

    Cumps.
    Roberto Simões
    CINEROAD – A Estrada do Cinema

    ResponderEliminar
  2. Roberto F. A. Simões,
    Realmente estranhava ainda não a teres publicado. Mas também consta entre os meus favoritos. E sim, realmente no que diz respeito aos conceitos do herói, do vilão e do polícia, no filme Em Carne Viva, Almodóvar deita esses estereótipos todos abaixo.

    ResponderEliminar