Realização: Tom Ford
Argumento: Tom Ford e Christopher Isherwood
Dificilmente encontramos palavras que consigam conter – de forma concisa ou alargada – a experiência do visionamento da primeira longa-metragem de Tom Ford. O impacto não é unicamente potenciado pela surpresa de este ser o seu primeiro trabalho no cinema. O impacto prende-se com a sensibilidade artística transmitida a cada frame, a cada zoom in, a cada linha de diálogo. A visão que temos, a visão que nos é dada – explícita ou implicitamente – é completa em sentimentos, em pequenos pormenores, em detalhes. Mais que mera beleza de quem é designer de moda, nota-se em Tom Ford um realizador atento aos detalhes por razões superiores às artísticas: sobretudo, denota-se uma enorme consciência social de quem conhece o mundo sobre o qual fala.
O Homem cujas 24 horas seguimos é um homem, de facto, singular. Único. É socialmente consciente, mas também contido. É invisível. Quer passar por invisível. Tanto exteriormente, como internamente. Isto porque o olhar que temos é todo ele sobre a passagem do tempo. Sobre a solidão, a tristeza, o luto, o recomeçar. George é uma personagem invulgar e única no mundo do Cinema. Singular, não nos cansamos de o dizer. É uma grande composição, muito mais que aquilo que nos revela, cheia de detalhes e com o qual facilmente o espectador se identifica. Apesar de ter vivido um grande amor, raras vezes o vemos exteriorizar aquilo que sente. É condicionado socialmente, esconde-se por detrás do padrão e do normativo. Tanto na forma como trabalha, como cria a sua máscara, imaculada, todos os dias, pela manhã. A sua saída para aquele que não é o seu mundo é preparada, meticulosamente. É harmoniosamente detalhada, rotineira, cuidada, metódica. É uma máscara. Não só a dele como a de todas as personagens. Todos vivem sob o espelho de uma sociedade ameaçada por uma guerra iminente. E todos se mascaram, se escondem. Todos os seus actos são encenados – até a sua morte é planeada ao mínimo detalhe. Será que parecerá bem? Ficará bonito?
Isto porque Tom Ford traz-nos a visão do belo, poético e romantizado. Embora o sentimento de George seja grotesco – o término da sua vida – não é isso que vemos. Vemos apenas aquilo que George quer transmitir. Reconhecemos-lhe a singularidade. Muito culpa da plástica que o realizador nos traz: uma visão altamente estilizada. Atento aos detalhes – tal como a sua personagem – Tom Ford traz-nos um argumento soberbamente adaptado para o cinema (original de Christopher Isherwood), mas também uma realização única. O zoom in a que somos continuamente sujeitos – os close-ups dos olhos, lábios e das mãos – é evidência da detalhada tendência do perfeccionismo e da aparência, tão habilmente retratadas em A Single Man. E depois temos as cores, a fotografia, os filtros cromáticos. Quando olhamos para George vemo-lo em sépia, em tons monocromáticos e frios. Quando olhamos, por exemplo, para Kenny, assistimos ao seu desejo, à sua luxúria e vemo-lo em tons quentes e alaranjados. De pormenores está o cinema de Tom Ford cheio. Falamos também de Charlotte. Personagem única, também ela singular e ambígua. Quando descemos profundamente àquilo que ela sente, encontramos uma figura que se encontra em podridão – solitária – subtilmente figurada pelo seu processo de transformação, pela maquilhagem que usa, pelos acessórios que escolhe, pelo vestuário que usa. Ou temos ainda uma visão quase almodovariana e quente, de um processo de sedução subtil. Tom Ford é genial.
E depois temos os actores. Um excelente lote de actores. Personagens de uma vida. Destaque óbvio para Colin Firth. Potencialmente um actor fantástico, é em A Single Man que revela o desperdício de talento a que muitas vezes assistimos. Facilmente indicamos o seu desempenho como o melhor do ano e embora não tenha ficado eternamente recordado pelo Óscar – vale-lhe pelo menos o reconhecimento de uma nomeação – dificilmente será esquecido o desempenho de uma vida. Longe do overacting a que actualmente assistimos, Colin Firth dá-nos uma lição de profundidade: não vemos explosões de fúrias, de tristeza, de alegria. Subtilmente vemo-lo no olhar, no andar, na expressão. Um trabalho inesquecível.
E depois temos uma grandiosa Julianne Moore. Personagem mais afectada e dramática, a actriz capta genialmente os seus maneirismos e incertezas. É uma personagem com nuances ambíguas e mesmo que o seu surgimento na trama seja breve, é das mais inesquecíveis de todo o filme.
Um Homem Singular é uma enorme e sensível desconstrução do ser humano. É uma das visões mais bonitas e subtis que tivemos oportunidade de assistir nos últimos anos. É a sensibilidade no seu auge, é a espectacularidade da simplicidade. E embora estejamos no início, facilmente conseguimos dizer que este é um dos melhores – senão o melhor – trabalho cinematográfico de 2010. Pela sua visão, pela sua singularidade, merece mais que um visionamento. Ficaremos encantados com os inúmeros detalhes que nos falharam à primeira. Indescritível, indefinível, profundo e tocante.
O Homem cujas 24 horas seguimos é um homem, de facto, singular. Único. É socialmente consciente, mas também contido. É invisível. Quer passar por invisível. Tanto exteriormente, como internamente. Isto porque o olhar que temos é todo ele sobre a passagem do tempo. Sobre a solidão, a tristeza, o luto, o recomeçar. George é uma personagem invulgar e única no mundo do Cinema. Singular, não nos cansamos de o dizer. É uma grande composição, muito mais que aquilo que nos revela, cheia de detalhes e com o qual facilmente o espectador se identifica. Apesar de ter vivido um grande amor, raras vezes o vemos exteriorizar aquilo que sente. É condicionado socialmente, esconde-se por detrás do padrão e do normativo. Tanto na forma como trabalha, como cria a sua máscara, imaculada, todos os dias, pela manhã. A sua saída para aquele que não é o seu mundo é preparada, meticulosamente. É harmoniosamente detalhada, rotineira, cuidada, metódica. É uma máscara. Não só a dele como a de todas as personagens. Todos vivem sob o espelho de uma sociedade ameaçada por uma guerra iminente. E todos se mascaram, se escondem. Todos os seus actos são encenados – até a sua morte é planeada ao mínimo detalhe. Será que parecerá bem? Ficará bonito?
Isto porque Tom Ford traz-nos a visão do belo, poético e romantizado. Embora o sentimento de George seja grotesco – o término da sua vida – não é isso que vemos. Vemos apenas aquilo que George quer transmitir. Reconhecemos-lhe a singularidade. Muito culpa da plástica que o realizador nos traz: uma visão altamente estilizada. Atento aos detalhes – tal como a sua personagem – Tom Ford traz-nos um argumento soberbamente adaptado para o cinema (original de Christopher Isherwood), mas também uma realização única. O zoom in a que somos continuamente sujeitos – os close-ups dos olhos, lábios e das mãos – é evidência da detalhada tendência do perfeccionismo e da aparência, tão habilmente retratadas em A Single Man. E depois temos as cores, a fotografia, os filtros cromáticos. Quando olhamos para George vemo-lo em sépia, em tons monocromáticos e frios. Quando olhamos, por exemplo, para Kenny, assistimos ao seu desejo, à sua luxúria e vemo-lo em tons quentes e alaranjados. De pormenores está o cinema de Tom Ford cheio. Falamos também de Charlotte. Personagem única, também ela singular e ambígua. Quando descemos profundamente àquilo que ela sente, encontramos uma figura que se encontra em podridão – solitária – subtilmente figurada pelo seu processo de transformação, pela maquilhagem que usa, pelos acessórios que escolhe, pelo vestuário que usa. Ou temos ainda uma visão quase almodovariana e quente, de um processo de sedução subtil. Tom Ford é genial.
E depois temos os actores. Um excelente lote de actores. Personagens de uma vida. Destaque óbvio para Colin Firth. Potencialmente um actor fantástico, é em A Single Man que revela o desperdício de talento a que muitas vezes assistimos. Facilmente indicamos o seu desempenho como o melhor do ano e embora não tenha ficado eternamente recordado pelo Óscar – vale-lhe pelo menos o reconhecimento de uma nomeação – dificilmente será esquecido o desempenho de uma vida. Longe do overacting a que actualmente assistimos, Colin Firth dá-nos uma lição de profundidade: não vemos explosões de fúrias, de tristeza, de alegria. Subtilmente vemo-lo no olhar, no andar, na expressão. Um trabalho inesquecível.
E depois temos uma grandiosa Julianne Moore. Personagem mais afectada e dramática, a actriz capta genialmente os seus maneirismos e incertezas. É uma personagem com nuances ambíguas e mesmo que o seu surgimento na trama seja breve, é das mais inesquecíveis de todo o filme.
Um Homem Singular é uma enorme e sensível desconstrução do ser humano. É uma das visões mais bonitas e subtis que tivemos oportunidade de assistir nos últimos anos. É a sensibilidade no seu auge, é a espectacularidade da simplicidade. E embora estejamos no início, facilmente conseguimos dizer que este é um dos melhores – senão o melhor – trabalho cinematográfico de 2010. Pela sua visão, pela sua singularidade, merece mais que um visionamento. Ficaremos encantados com os inúmeros detalhes que nos falharam à primeira. Indescritível, indefinível, profundo e tocante.
Gosto destas tuas críticas assim :)
ResponderEliminarO filme realmente é tudo o que disseste e talvez um pouco mais, um argumento que podia ter sido igual a tantos outros transformou-se numa obra de arte.
:) É uma forma nova de me expressar.
ResponderEliminarO argumento por si só já é ele único e mais complexo que à partida parece. Mas a realização sensível de Tom Ford trouxe-lhe uma nova visão.
Parece bom, fico curioso para ver! :)
ResponderEliminarEu adorei, a mim tocou-me bastante. Mas depende sempre dos gostos. :)
ResponderEliminarAquilo que tinha para falar era tanto que até me esqueci de mencionar a lindíssima banda sonora. Tão encantadora e tão forte. Linda mesmo.
ResponderEliminarE eu que ainda não o vi? Lol comenta!
ResponderEliminarAh que sacrilégio! E eu a pensar que o tinhas visto este fim-de-semana! :O
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