domingo, 12 de dezembro de 2010

Cela 211, por Carlos Antunes


Título original: Celda 211

O motim prisional é um género que guarda carinhosas memórias para muitos cinéfilos e é bom vê-lo de regresso com uma base tão original como a de um guarda prisional a lutar pela sobrevivência através do fingimento de uma condição de prisioneiro.
O motim é sempre um meio próprio e feroz de confinar a tensão e as personalidades e fazê-las eclodir.


Ainda mais importante, neste caso, é a questão da própria identidade e a transformação das expectativas e comportamentos dessa personagem central que estará sempre sujeita a dois papéis - polícia e criminoso - independentemente de o desejar ou não.
A transformação de Juan Oliver ocorre à força das circunstâncias extremas a que ele está submetido que, num período breve mas de enorme tesão, lhe moldam a personalidade.
A sua lealdade para com a Lei vai até onde lhe é possível sustentar a sua vida.
Mas ambos os lados da Lei são aglomerados de homens cujas acções não são sempre consonantes com o seu papel.
As verdadeiras lealdades derivam da dádiva prática e emocional que a cada momento a dinâmica de um grupo oferece e não de um ideário imutável e irredutível.
As relações que Juan estabelece de um lado e doutro são sinónimo, acima de tudo, da posição solitária que cada um tem no mundo.


A relevância maior do filme está nas suas personagens que assumem os seus papéis com um realismo impressionante.
A descoberta de que a maioria dos secundários são ex-presidiários só valoriza ainda mais a brilhante interpretação de Luis Tosar que teve, certamente, de conquista a liderança daqueles homens ferozes.
Tosar é brilhante e instintivo. A sua interpretação aqui é uma daquelas que o inscreve em permanência na memória geral e o reforça na memória dos que estiveram desde sempre mais atentos.


Só o comentário político do filme é que abre algumas brechas no cerrado drama dos homens no interior da prisão.
Não é pertinente no seio do filme nem a sua inserção na narrativa é precisa - até porque traz o exterior à baila, quando todo o drama decorre do encerramento no interior daquela prisão.
Compreende-se que esteja lá para dar ao filme uma âncora de realismo e contemporaneidade e até deixamos que isso passe por nós facilmente pela força do resto do filme.
Isso, sim, é o essencial. Que mesmo se uma pequena engrenagem seja mais fraca que as restantes isso não afecte o funcionamento do mecanismo. O filme resiste.


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