sábado, 19 de março de 2011

Casino Jack - O Dinheiro dos Outros, por Carlos Antunes


Título original: Casino Jack
Realização: George Hickenlooper
Argumento: Norman Snider
Elenco: Kevin Spacey, Barry Pepper e Jon Lovitz

O filme começa com Jack Abramoff a ser metido numa cela com dois criminosos de pouca monta.
Iniciam a troca de motivos para estarem ali e ele explica que se limitava a receber e reencaminhar dinheiro de quem queria ver os seus interesses defendidos em Washington para quem os podia defender.
Explica de modo simples e inócuo como usar influência para que houvesse temas em debate nos locais certos. E, em consequência, logo os seus dois companheiros lhe respondem "mas isso nada tem de mal".


Toda a história dele vem depois, relatada como interregno , escapismo do problema que tem em mãos: um processo e a prisão.
Contada como evidência de inocência, um relato de azares e injustiças que o acometeram e que demonstram bem o erro de que seja ele a estar ali.
Ele era tão bom que, mesmo atrás das grades, o seu relato é uma magnífica prosa de inocentação. Convincente e inegável, a menos que se conheçam os verdadeiros efeitos do que se passou.
Isso faz o filme, dando-nos a alegre perspectiva de Abramoff com extensões para a realidade que nem ele conseguiria embelezar à sua medida.


O tom cómico do filme é quase burlesco, em que o absurdo, sobretudo financeiro, parece não afectar a forma de estar das personagens que estabelecem os planos mais absurdos com confiança.
Mas, ao contrário de Buster Keaton com a sua honesta dignidade no seio do acaso e do absurdo, estas personagens estão conscientes de como se movem em zonas mais cinzentas da sua realidade, mas fingem a seriedade até para si próprios.
Estão iludidos perante o ridículo financeiro que o espectador já está capaz de identificar de tão "queimado" foi.


Kevin Spacey é o homem certo no filme certo. Capaz de dar dignidade e serenidade a uma irrisão sobre as ilusões dos homens que se moviam no seio dos centros nevrálgicos monetários, os mesmos centros que originaram a crise que hoje conhecemos de perto.
Ele domina o tom da comédia de forma a não a tornar nem panfletária nem numa mera tonteria, dando dignidade à sua personagem mesmo no seio das mais absurdas expectativas que tenha.
O filme ficou um pouco esquecido na estreia, até porque outros filmes de géneros mais "sérios" sublinharam a questão, mas que valerá redescobrir à conta do seu actor principal.



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