quinta-feira, 19 de maio de 2011

Entrevista a André Guiomar, realizador da curta-metragem "Píton"

Em apenas uma semana, o jovem cineasta André Guiomar viu o seu trabalho Píton - uma curta-metragem documental sobre Juliana, uma jovem pugilista de 18 anos - ser agraciado em dois festivais diferentes. Além de uma menção honrosa nos XI Encontros de Viana, conseguiu ganhar em todas as categorias para as quais competia no Festival Black & White 2011, vencendo assim o Grande Prémio Vídeo, Melhor Vídeo Documentário e o Prémio do Público de Vídeo. Um prazer a dobrar já que venceu estes prémios no local onde sonhou apresentar um trabalho seu.

O Split Screen foi à conversa com André Guiomar e ficou a saber quais as suas motivações e expectativas.

No espaço de uma semana viste o teu mais recente trabalho “Piton” receber quatro prémios distintos, três deles no Festival Black & White 2011. Qual foi a sensação?
Como é óbvio a sensação foi muito boa, o reconhecimento do nosso trabalho com tantos prémios logo na estreia fez-me acreditar ainda mais no filme. A questão de três deles serem no Festival (Internacional) Black & White dá-lhe um sabor ainda mais especial por ser o festival que acompanho à quatro anos na "minha casa", na minha universidade, com o primeiro público que tenho (amigos, professores, familiares). Lembro-me da primeira sessão que assisti no festival naquele auditório e de sonhar poder estar a apresentar um filme enquanto estudante. Não só acabei por conseguir como também acabei por ganhar todos os prémios a que concorria, melhor sensação seria impossível.

Como decorreu a produção desta curta-metragem? Tiveste dificuldade em conseguir os apoios e meios necessários?
Desde a ideia inicial até ao produto final, passou mais de um ano e meio e foi tudo feito sem qualquer tipo de apoio monetário. Era o meu projecto final de licenciatura então tive direito a material para as filmagens e pós-produção por parte da Universidade Católica e o Professor Carlos Lobo, coordenador do projecto, deu-me bastantes indicações para melhora-lo. Não foi uma produção fácil, sobretudo porque sendo o tema central o boxe jogado por uma jovem de 18 anos, eu queria vê-la e filma-la a preparar-se para combater e isso tornou-se difícil depois de meio ano a chegar a combates marcados e as adversárias nunca aparecerem. Houve alturas em que pensei mesmo que já não iria conseguir entregar o filme a tempo visto ser o meu projecto final de licenciatura. Mas semanas antes da deadline lá apareceu uma adversária espanhola com coragem de enfrentar a "Píton" numa gala em Matosinhos. A relação de amizade que já tinha com a Juliana facilitou bastante poder-me intrometer nos balneários e conseguir imagens e conversas únicas.



Porquê um documentário?
Curiosamente cada vez gosto mais de documentário e menos de ficção. Aprecio a capacidade de criar uma ficção mas a procura incessante da realidade e da verdade (que é impossível em cinema), deixa-me fascinado. Comparo a capacidade de fazer um documentário com a capacidade dos fotógrafos em verem um sitio e tirarem uma certa fotografia, há uma procura incessante de temas e lugares que nos fazem apreciar o que nos rodeia. Não que isso não aconteça numa ficção mas a questão dos limites entre documentário e ficção fazem-me tentar mais minimizar a "inverdade" naquilo que filmo.

“Piton” aborda o pugilismo. Inspiraste-te em alguns filmes que abordam essa temática para realizar a curta-metragem?
Não me inspirei num tema para depois ir buscar o personagem mas sim ao contrário. Já conhecia a Juliana antes e tinha-a como uma das pessoas mais simpáticas, calmas e a quem se costumava usar a expressão "não faz mal a uma mosca". O meu choque de quando a minha mãe me conta que ouviu dizer que ela era campeã nacional de boxe deixou-me perplexo. Quis assistir com os meus olhos então comecei por fazer-lhe uma entrevista num treino a que fui assistir e foi nessa altura que me deu vontade de fazer um documentário sobre ela para poder perceber quais foram as motivações que levaram aquela pessoa que eu conhecia à tantos anos, a entregar a sua vida a uma modalidade que envolve tanto contacto físico e, grande parte das vezes, bastante violento. Curiosamente a meio do processo de produção vi pela primeira vez o "Belarmino" do Fernando Lopes e adorei. Vendo agora o "Píton" acho que tem muitas parecenças.



Porque escolheste este tema?
Como já disse o tema veio a partir da personagem. Pareceu-me o tema certo por não ser comum ver no boxe uma campeã feminina tão nova. Era um desporto que desconhecia por dentro e nunca tinha assistido a um combate ao vivo.

Achas que fazeres o curso de Som e Imagem na Universidade Católica do Porto contribuiu de uma forma especial para a tua visão de cinema? De que forma a faculdade contribuiu para o teu crescimento?
Queria frisar que todo o filme foi feito durante a licenciatura. Acho incrível quando olho para trás e penso que quando entrei na Universidade nunca tinha trabalhado nem com uma máquina fotográfica muito menos com uma câmara de filmar. Três anos depois faço o "Píton" e a área que mais me fascina, mais até que realização, é direcção de fotografia. A mim, a Universidade trouxe-me realmente uma visão diferente do mundo porque vivia numa aldeia, consumia muita televisão, desconhecia por completo a Internet e não lia jornais nem revistas. Não me questionava sobre grandes problemas mundiais a não ser os sensacionalistas que alguns media desenvolvem. Entrar na faculdade, ainda por cima numa cidade como o Porto, fez-me entrar noutro "mundo", aperceber-me de imensos problemas e sobretudo crescer. Além disto tudo, a Universidade dá-nos a possibilidade de tentar e de errar, e isto é muito importante, nomeadamente em cinema. Sinto que quando sair da Universidade já saiu dentro desse outro mundo e com muitos erros já corrigidos.

Queres falar-nos sobre os teus trabalhos passados?
A não ser um videoclip que fiz, os meus trabalhos passados não passam de exercícios, experiências para errar como já referi. Este filme é realmente o meu primeiro Filme.



Tens planos para a distribuição e promoção de “Píton”?
Penso que os planos que tenho para a distribuição do filme são bastante normais: enviar para festivais de cinema. Ainda não estou propriamente dentro da área de promoção para perceber o que este ou outro filme pode dar. Por enquanto, e depois de ter estreado cá em Portugal e de ter tido um feedback muito positivo dos júris estrangeiros, quero realmente tentar que o filme seja visto fora de Portugal, porque acho que esta troca de culturas através do Documentário é uma grande vantagem do cinema.

Já te encontras a trabalhar num novo projecto?
Sim, depois do "Píton" já estive envolvido em mais dois documentários ("Paulo Neves - Cucujães, O Centro do Meu Mundo" e uma longa em fase de pós-produção) e uma ficção. Tenho produzido também alguns videoclips. Já tenho ideia para um próximo documentário mas nesse vou mesmo precisar de apoios para poder realiza-lo, então é possível que ainda demore antes de começar a ser feito.

Quais são as tuas maiores influências no mundo do cinema?
Os realizadores que conseguem ter um leque de filmes em que eu gosto da grande maioria que vi são Theodorus Angelopulos, Harmony Korine, Kim Ki-duk e Werner Herzog. Há muitos mais que me influenciam em vários aspectos mas estes 4 tem um estilo completamente distinto uns dos outros e mantém-no sempre nas suas obras, e muito bem.

1 comentário: