terça-feira, 21 de janeiro de 2020

Star Wars: Episódio IX - A Ascensão de Skywalker, por Eduardo Antunes


Realização: J.J. Abrams
Argumento: Chris Terrio, J.J. Abrams, Derek Connolly, Colin Trevorrow

Este filme é um produto da sociedade fanática em que surge e a qual serve, sendo o seu público na verdade o único culpado pelo resultado. O desapontamento generalizado e crescentemente verbalizado face as expectativas criadas para com o empreendimento anterior, levaram a máquina corporativa que infelizmente consumiu este outrora produto arriscado a procurar responder ao e com o previsível, proporcionando resultados ainda piores que o expectável.

Se as minhas expectativas pessoais já teriam sido rebaixadas aquando da minha entrada na sala, devido à correção de rumo adoptada em relação a The Last Jedi – que desde logo o teaser apresentava na sua aposta em elementos passados para buscar o nosso interesse –, as ligações com o cânone anteriormente estabelecido são sintomáticas da falta de visão para a franquia reiniciada e para o seu final mas, pior, claramente uma forma de apaziguar os fãs (e garantir o seu pagamento multiplicado de ingressos para o filme, depois das "baixas" receitas de Solo).
O regresso da personagem de Palpatine, presente já em seis dos nove episódios que compõem agora esta saga, não só se apresenta rebuscado e disparatado, como totalmente desnecessário, por ter sido deixado em aberto o desenvolvimento de Kylo Ren como o principal e único antagonista, totalmente incerto e volátil, sem real noção das potenciais consequências dos seus actos insensatos ou qualquer desejo genuíno de comandar a Primeira Ordem, que desde logo o não veria como um líder merecido.



É até interessante reconhecer a partilha do exacto problema de Spectre, em que a falta de noção em como prosseguir a história iniciada há uns quantos filmes atrás levou a adoptar a explicação mais facilitada e menos imaginativa possível, como tentativa de unificar os pontos para os quais não havia sequer a necessidade. A ideia apresentada imediatamente na primeira cena (que pode ser vista abaixo) de um vilão do passado que, sem explicação satisfatória, supervisionava desde o princípio todas as acções desta nova trilogia, sem qualquer dica ou nuance anterior oferecida, vai contra, não só os planos do anterior realizador, como do próprio.

Desde o texto inicial que somos remetidos como que para todo uma nova sequência de filmes que ali inicia e não parte dos pontos narrativos anteriores. E ao longo do filme, é bem patente apenas a inclusão de algumas referências aos filmes anteriores quando se apresenta conveniente à narrativa em questão. Isto é tão mais problemático no que toca às personagens que acompanhamos desde The Force Awakens, já que, no desejo de apresentar uma aventura para derrotar o "novo" vilão, é o desenvolvimento dramático de Finn e Poe completamente marginalizado em detrimento de consequentes buscas por demasiados elementos inexplicados. Isto chega ao seu total absurdo quando os heróis, de forma aleatória, encontram uma mera adaga que estúpida e convenientemente apresenta as coordenadas que procuravam, por não haver imaginação suficiente para desenvolver a narrativa através dos nossos heróis, em vez de para lá deles.


Além disso, e como o próprio filme se ofereceu (desnecessariamente) enquanto finalizar de toda a franquia episódica, torna também insatisfatória a resolução de filmes anteriores (e mesmo de outro material canónico não cinemático), retirando o impacto de cenas estruturantes dos filmes originais e acabando por deixar mais questões que explicações. Se Palpatine tivera sempre um plano para recuperação na eventualidade da sua morte, o que significa na verdade o sacrifício e redenção de Vader / Anakin em Return of the Jedi? E se esse plano estava desenvolvido, como é demonstrado pela sua aparente criação de Snoke e pela larga frota que Palpatine tem pronta para ser despoletada (cada nave com a sua arma destruidora de planetas) porque esperou 42 anos para regressar na sua "pele original"? Nota-se que o seu regresso não sofreu qualquer segundo pensamento para lá da satisfação dos que procuravam apenas um recontar dos filmes originais sob uma nova pele, sendo nós incitados a ler material adicional para ter o mínimo entendimento das questões que o filme deveria responder por si só.

E como Palpatine substitui Kylo Ren como o verdadeiro antagonista, também este fica sem qualquer desenvolvimento satisfatório, no que poderia ter sido a sua potencial descida crescente no lado negro até à sua eventual e trágica queda. E mesmo na sua suposta redenção, tudo se sente apressado e imérito, sendo até necessária uma cena igual a uma outra de Batman v Superman (contributo certo do argumentista em comum, Chris Terrio), forçadamente introduzida apenas para que mais tarde a personagem de Ben Solo possa ajudar a protagonista na sua luta contra o vilão (re)apresentado – e contra si própria. Pois, em vez deste, é Rey a quem aqui é introduzida uma dicotomia antes inexistente entre os dois lados da força.


Mesmo o climático duelo, no final do segundo acto, entre Rey e Ben nos destroços da Estrela da Morte destruída não tem realmente propósito, por não haver um intuito no duelo em si. Da casual demonstração da irritação de Rey à vontade inconsequente de Ben a derrotar, nada nos permite investir neste forçado conflito que surge como obrigatório duelo de sabres no final da saga. E no seu final, nem a aparente resolução dramática tem impacto, por ser imediatamente desfeita com um novo elemento que retira narrativamente qualquer conflito que possa existir daí para a frente, o que faz com que, aparte o interessante fundo visual, não fique grande impacto num duelo que deveria ser o culminar da relação entre os dois personagens centrais da trilogia.

Na última batalha, os pormenores narrativos já nos passam ao lado, tão atónitos e expectantes pelos créditos que estamos, reconhecendo apenas em retrospectiva a total falta de sentido que todo o terceiro acto apresenta. É esquecido qualquer sentido de lógica, em detrimento de aspectos visuais que nos atiçavam nos trailers mas que nem aqui já se sentem estimulantes.
Tudo isto faz com que, o que há mais de quatro décadas se formalizou como revolucionário na forma como adaptava narrativas comuns a um universo gerado com verdadeira criatividade, termine como qualquer outro dos intermináveis blockbusters que povoam os cinemas, estupidificando na totalidade a nossa apreciação do filme com uma fraca tentativa de percorrer uma lista de solicitações dos fãs sem uma narrativa que as aglomere com criatividade suficiente para se tornar minimamente memorável. Nada que a Disney não nos tenha já habituado nos últimos anos.



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