Realização: Xavier Dolan
Argumento: Xavier Dolan
Elenco: Melvil Poupaud, Suzanne Clément, Nathalie Baye e Monia Chokri
Do rótulo adquirido de jovem-prodígio já muito se falou, mas é efectivamente notável que aos dezanove anos, o canadiano Xavier Dolan tenha produzido, escrito, realizado e protagonizado o seu primeiro filme J’ai tué ma mère e que este tenha sido seleccionado e premiado no Festival de Cannes. Os seus dois trabalhos subsequentes, incluindo este Laurence Anyways, tiveram basicamente o mesmo percurso, fazendo da sua figura de jovem realizador uma das mais interessantes da actualidade. Mas se em Les amours imaginaires (2010), evidenciava já uma excessiva dose de arrogância (talvez própria da idade), mas que implicava uma certa redundância no seu trabalho, as boas notícias são que em Laurence Para Sempre estamos perante um trabalho largamente superior. Trabalho este muito mais maduro e consistente e que prima sobretudo por um tema socialmente premente e bastante interessante do ponto de vista psicológico. Como enfrentar um corpo que não condiz com o seu interior? Mas o tema vai mais além de uma mudança de sexo de homem para mulher. O ponto de interesse e drástica complexidade envolve o relacionamento de uma personagem outrora homem, apaixonado por uma mulher, e que agora se torna também ele mulher. Amará essa mulher a mesma pessoa, apesar da mudança? Um tema complexo que o jovem realizador aborda com uma desenvoltura invejável para muitos e com uma noção de delicadeza e classicismo já habituais no seu cinema, com uma grande atenção aos detalhes de cenário, figurinos e fotografia. Entregue ao melodrama clássico, Xavier Dolan ensaia uma série de referências mais ou menos cinéfilas, mais ou menos contemporâneas, sempre com bom-gosto e apresentando cenas visualmente imponentes e extravagantes, de uma beleza rara. O habitual embrulho de maneirismos e afecções do seu cinema, mas dotado de noções mais adultas e maduras.
Mas com certeza aquilo que distinguirá Laurence Para Sempre das suas duas últimas longas-metragens envolve uma soberba direcção de actores. Melvil Poupaud tem o seu cargo uma personagem incrivelmente detalhada, tridimensional, repleta de ambiguidades, com uma segurança notável, convergindo nas próprias inseguranças e convicções de uma personagem que enfrenta o mundo de uma nova perspectiva. Suzanne Clément complementa este trabalho incrível, com uma personagem tão ou mais complexa, entregue a um dilema moral e de sentimentos, deixando para o espectador assistir às alterações de um relacionamento na década de 90, à medida que as alterações físicas e sociais influenciam positiva ou negativamente o percurso de ambas as personagens. Com um arco narrativo tão complexo, profundo, denso e detalhado, não deixamos de todo de lamentar a sua excessiva duração, quando por momentos o argumento precisava de ser fechado para que a história não se dispersasse em demasia.
Mas não deixamos de notar com bons olhos esta evolução no trabalho de Xavier Dolan, esperando que o seu arrojo visual e o seu fascínio quase obsessivo por um estilo pop acabe por se tornar cada vez menos intrusivo nas suas histórias. A verdade é que o seu olhar e o estilo são pequenos e magníficos acontecimentos no cinema contemporâneo e este Laurence Para Sempre é um melodrama notável, de uma importância e consciência sociológica interessantíssima.
Do rótulo adquirido de jovem-prodígio já muito se falou, mas é efectivamente notável que aos dezanove anos, o canadiano Xavier Dolan tenha produzido, escrito, realizado e protagonizado o seu primeiro filme J’ai tué ma mère e que este tenha sido seleccionado e premiado no Festival de Cannes. Os seus dois trabalhos subsequentes, incluindo este Laurence Anyways, tiveram basicamente o mesmo percurso, fazendo da sua figura de jovem realizador uma das mais interessantes da actualidade. Mas se em Les amours imaginaires (2010), evidenciava já uma excessiva dose de arrogância (talvez própria da idade), mas que implicava uma certa redundância no seu trabalho, as boas notícias são que em Laurence Para Sempre estamos perante um trabalho largamente superior. Trabalho este muito mais maduro e consistente e que prima sobretudo por um tema socialmente premente e bastante interessante do ponto de vista psicológico. Como enfrentar um corpo que não condiz com o seu interior? Mas o tema vai mais além de uma mudança de sexo de homem para mulher. O ponto de interesse e drástica complexidade envolve o relacionamento de uma personagem outrora homem, apaixonado por uma mulher, e que agora se torna também ele mulher. Amará essa mulher a mesma pessoa, apesar da mudança? Um tema complexo que o jovem realizador aborda com uma desenvoltura invejável para muitos e com uma noção de delicadeza e classicismo já habituais no seu cinema, com uma grande atenção aos detalhes de cenário, figurinos e fotografia. Entregue ao melodrama clássico, Xavier Dolan ensaia uma série de referências mais ou menos cinéfilas, mais ou menos contemporâneas, sempre com bom-gosto e apresentando cenas visualmente imponentes e extravagantes, de uma beleza rara. O habitual embrulho de maneirismos e afecções do seu cinema, mas dotado de noções mais adultas e maduras.
Mas com certeza aquilo que distinguirá Laurence Para Sempre das suas duas últimas longas-metragens envolve uma soberba direcção de actores. Melvil Poupaud tem o seu cargo uma personagem incrivelmente detalhada, tridimensional, repleta de ambiguidades, com uma segurança notável, convergindo nas próprias inseguranças e convicções de uma personagem que enfrenta o mundo de uma nova perspectiva. Suzanne Clément complementa este trabalho incrível, com uma personagem tão ou mais complexa, entregue a um dilema moral e de sentimentos, deixando para o espectador assistir às alterações de um relacionamento na década de 90, à medida que as alterações físicas e sociais influenciam positiva ou negativamente o percurso de ambas as personagens. Com um arco narrativo tão complexo, profundo, denso e detalhado, não deixamos de todo de lamentar a sua excessiva duração, quando por momentos o argumento precisava de ser fechado para que a história não se dispersasse em demasia.
Mas não deixamos de notar com bons olhos esta evolução no trabalho de Xavier Dolan, esperando que o seu arrojo visual e o seu fascínio quase obsessivo por um estilo pop acabe por se tornar cada vez menos intrusivo nas suas histórias. A verdade é que o seu olhar e o estilo são pequenos e magníficos acontecimentos no cinema contemporâneo e este Laurence Para Sempre é um melodrama notável, de uma importância e consciência sociológica interessantíssima.
Sem comentários:
Enviar um comentário