sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Semana em Crítica - 7 de Novembro

Um Fim do Mundo (2013), de Pedro Pinho


Uma aposta nacional, que ficciona a realidade de um grupo de jovens, recorrendo a não-actores e possibilitando múltiplas e interessantes leituras, com a vida real. A liberdade de movimentos e interpretações garante-lhe alguma honestidade e simpatia, sobretudo pelo carisma dos seus protagonistas, dando uma visão sobre a estrutura de pares e a adolescência. A belíssima direcção de fotografia, a preto e branco, dá-lhe uma beleza singular. Uma estrelaUma estrelaUma estrela½ Tiago Ramos





Apesar da curta duração, Cama de Gato é um dos melhores e mais interessantes filmes portugueses dos últimos anos. A dupla de realizadores revela-se mais uma vez como uma das mais promissoras da actualidade, com uma história onde se torna difícil distinguir a ficção da realidade, recorrendo a uma actriz amadora, para retratar uma versão ficcionada da própria vida. De uma energia aparentemente inesgotável, assim como de uma sinceridade brutal e portanto esmagadora, a sua interpretação, dá ao filme toda uma diferente camada de significados, que torna este filme como um interessante objecto fílmico. Uma estrelaUma estrelaUma estrelaUma estrela½ Tiago Ramos





Uma curta-metragem onde o espaço é o protagonista, ao invés das personagens que nele habitam. Através da arquitectura do bairro onde é filmado (um lugar com as varandas interligadas entre si, como espaço de passagem e de intercâmbio, que foi sendo vedado ao longo dos anos pelos seus moradores), filma-se a utopia e os ideais do seu arquitecto, assim como a clausura e a não-conexão entre as pessoas. Um trabalho curioso, mas também de certo modo redutor e limitado. Uma estrelaUma estrelaUma estrela½ Tiago Ramos


Sudoeste (2012), de Eduardo Nunes


Um primeiro trabalho de um realizador com uma elegância e inteligência fabulosas. Com uma fotografia a preto e branco, assim como uma câmara que faz lembrar o cinema de Béla Tarr (remete-nos logo para A torinói ló), a cena inicial é logo por demais entusiasmante, assim como perturbadora. O som e a sua repetição como método de trabalhar uma estranheza e experimentalismo da narrativa, potencia um argumento surpreendente que condensa num único dia toda a vida da sua protagonista, repleto de simbologias e realismo mágico. Pedaço de filme fora do seu tempo, é um filme imponente e de esquecimento difícil. Uma estrelaUma estrelaUma estrelaUma estrela Tiago Ramos



O Jogo Final (2013), de Gavin Hood


O protagonismo de um jovem personagem não deve levar ninguém ao engano de pensar que os temas deste universo de ficção científica são próprios de um público juvenil. A guerra manipulada à distância - em estilo de jogo - e, portanto, livre de constrições morais ou a militarização da mentalidade dos jovens são ramificações de um tema maior: a possibilidade de justificar a guerra preventiva. Temas cuja actualidade ainda não está resolvida. Orson Scott Card manteve-se atento à adaptação da sua obra, o que só pode ter contribuído para manter a maturidade da obra mesmo quando os temas tiveram de ser agilizados em função de um espectáculo visual que está, de facto, acima da média de tempos recentes. Se um ou outro momento do filme parece funcionar como espectáculo, perdendo de vista a sua funcionalidade na narrativa global, a obra aguenta tanto o público exigente como o mais casual, revelando-se muito satisfatória. Esse resultado leva a registar uma grande surpresa: o talento de Gavin Hood. Depois de dois falhanços em Hollywood e de uma injustificada aclamação a Tsotsi, o realizador e argumentista consegue ser o autor de um filme capaz de dar mais do que meros efeitos especiais ao público que decidir ir vê-lo - e que, como sabemos, não deve ser pouco. Uma estrelaUma estrelaUma estrela Carlos Antunes



Desligados (2012), de Henry Alex Rubin


Por mais curiosa que seja a forma narrativa, a verdade é que a estrutura-mosaico da maioria dos filmes, com histórias paralelas que ocorrem em simultâneo e que se conectam entre si, nem sempre produz os melhores resultados, com uma frequente desconexão dos vários segmentos. Curiosamente, o argumento de Desligados sabe lidar competentemente com a estrutura, dando voz e destaque a cada uma das personagens e histórias, assim como uma identidade muito própria, permitindo-lhes serem mais do que meros arquétipos ou estereótipos. A narrativa beneficia da coesão da sua realização (assim como aspectos mais técnicos como a direcção de fotografia e a banda sonora), que garantem um tom sincero, honesto e emocional. O mesmo acontece com o elenco, primoroso nos seus papéis, com destaque para a surpresa que se revelou Jason Bateman, com um papel dramático, extremamente forte e impressionante. Todas as histórias estão ligadas entre si através do tema da tecnologia e a forma como esta influencia as nossas vidas. Cyberbullying, roubo de identidade e prostituição são alguns dos temas abordados que, mesmo contendo argumentos válidos e profundamente actuais, não deixam também se algo redutores e unidimensionais, numa mensagem subtilmente pedagógica, dando sempre à tecnologia uma conotação negativa. Uma estrelaUma estrelaUma estrelaUma estrela Tiago Ramos

Um filme-mosaico sobre os perigos da intenet e como estes afectam as pessoas para lá do ecrã seria sempre um objecto estranho, tanto quanto mais se esforçasse por unir os dramas individuais num mundo que deveria ser gloalizado mas que aqui parece reduzido a um raio de alguns quarteirões. O potencial das histórias de manipulação - emocional ou de identidade - online perde-se numa transformação das mesmas em engrenagens para colocar em marcha confrontos já sem o intermediário tecnológico e todos de uma banalidade narrativa. A excepção é a história em torno da personagem de Jason Bateman cujas ramificações emocionais estão assentes num bizarro convivência online com uma amiga do seu filho (após uma tentativa de suicídio deste) que é, na verdade, o rapaz que o humilhou. Até porque Jason Bateman sustenta essa história com uma interpretação cuja força não era expectável perante o que são as suas chamadas a terreno cómico. À sua volta, tirando a superior qualidade da banda sonora, os muitos talentos envolvidos, sejam os actores ou o montador, surgem sem uma centelha digna de nota, o que faz com que o problema deste filme seja uma conformidade a um modelo de cinema pouco ousado que assegura uma fácil relação com o público e nada mais. Tal é particularmente grave para Henry Alex Rubin para quem a passagem à ficção dá ideia de ter perdido a energia irreverente que fez de Murderball um merecido fenómeno. Uma estrelaUma estrelaUma estrela Carlos Antunes



De Bicicleta com Molière (2013), de Philippe Le Guay


Dois actores no processo de ensaio para O Misantropo são eles próprios encarnações dos personagens da peça e deixando-se influenciar pelo própria. Sátira antiga na base de uma sátira moder, que fala precisamente da mesma ocupação que valoriza constantemente: a interpretação. Um microcosmos dividido entre os extremos da fama e da eremitania, entre a aparente possibilidade de amizade e a mais do que comum traição. Um retrato tanto da vilania como da grandeza humana tratada por Philippe Le Guay com um cuidado que tem as características formais do cinema popular francês mas que se sabe deixar levar por um par de actores que iniciam o filme num falso apagamento para se permitirem atingir os limites mais arrebatados sem deixar cair a subtileza das emoções jogadas num confronto de quatro personagens em simultâneo que parecem ir sempre trocando os corpos que habitam. Um excepcional jogo dos actores Fabrice Luchini e Lambert Wilson que fazem por homenagear as palavras de Molière enquanto criam momentos de forte retruques a que o público não pode deixar de render-se. Os extremos, novamente: classicismo respeitoso e apelo popular. Tudo aquilo que a interpretação pode e deve ser. Uma estrelaUma estrelaUma estrela½ Carlos Antunes

O filme utiliza dois grandes actores, com duas notáveis interpretações, que se reúnem através da representação, como forma de desenvolver um estudo sobre a natureza humana. Sobretudo, um filme sobre a amizade, simultaneamente como ligação entre os dois protagonistas, mas também como motivo de duelo. O argumento faz uma utilização bastante simpática do texto de O Misantropo, de Molière, para transmitir ambiguidade ao discurso dos actores/personagens. Porém, onde o argumento é capaz de brincar, a realização de Philippe Le Guay não é competente o suficiente para perceber que se calhar (com este argumento e estes actores) bastava concentrar a câmara nos protagonistas. Prefere deambular-se também para além disso, o que tira toda a intensidade que parecia conter. Uma estrelaUma estrelaUma estrela Tiago Ramos



Nunca Desistas (2012), de Daniel Barnz


Um filme que contém um (claro) manifesto a favor da reforma educacional norte-americano e que por isso sofre de uma pedagogia excessiva, assim como de todos os clichés que daí advêm. Mas a verdade é que a linha narrativa central é suficiente para entreter o espectador, assim como a interpretação de duas grandes actrizes (Viola Davis e Maggie Gyllenhaal) e que enriquecem o resto e minimizam as falhas que o realizador não soube colmatar. Uma estrelaUma estrelaUma estrela½ Tiago Ramos

A confusão do sistema educativo americano e a sua dependência ou do esforço altruísta de alguns educadores ou do mero acaso de um sorteio para garantir às crianças um ensino de qualidade já tinha sido bem abordado em Waiting for Superman, um documentário de Davis Guggenheim mais informativo do que imaginativo. Esta abordagem dramática ao assunto, encabeçada por duas excelentes acrizes, poderá ter servido para falar a um público mais alargado, mas fora do seu país de origem teria de funcionar com algo mais do que boas intenções sobrecarregadas de elementos demonstrativos da realidade local. A manipulação descarada do público, tentada mesmo até à última palavra do filme, mina qualquer força dramática que as actrizes pudessem imprimir à história e apenas prolonga o filme até umas maçadoras duas horas. Uma estrelaUma estrela Carlos Antunes



Presa na Escuridão (2013), de Joseph Ruben


Em 1989 Tim Burton via em Michael Keaton um grande actor que poderia fazer muito mais do que comédias. Em 2013, para o vermos a trabalhar, temos de escolher um dos piores filmes que passaram pelas nossas salas. Os problemas que esta evolução torna óbvios são muitos e já irremediáveis.
Para se matar saudades de Michael Keaton tem de se ir ver um thriller sobre uma rapariga cega feita refém numa penthouse por Keaton e um associado que estão lá à procura de uns diamantes. Seria um filme formulaico se não fosse ridículo, com a rapariga cega a correr em direcção a portas de vidro e às bordas do terraço mas evitando os perigos como quem consegue ver. Fica patente que os talentos de Michelle Monaghan para o papel de cega merecem o mesmo tipo de piadas que há uns anos Sofia Alves recebia pelo mesmo tipo de papel. Uma estrela Carlos Antunes

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