sexta-feira, 23 de agosto de 2019

Era Uma Vez em... Hollywood, por Eduardo Antunes

https://splitscreen-blog.blogspot.com/2019/08/era-uma-vez-em-hollywood-por-eduardo.html

Título original: Once Upon a Time in... Hollywood (2019)
RealizaçãoQuentin Tarantino
Argumento: Quentin Tarantino

Tendo iniciado o meu percurso pela filmografia de Tarantino com o(s) último(s) do que eu denomaria como a primeira parte da sua carreira, e enveredando pela sua segunda parte, chegando a este Era Uma Vez em... Hollywood, fica um pouco mais clara a sua contínua predilecção por temas que reflictam a época abordada, mas denotando-se também uma aparente vontade de manter alguns aspectos que se tornaram agora uma sua imagem de marca, seja por ser esperado pelos fãs ou pela sua própria saciedade.

Kill Bill, na sua divisão em duas partes, demonstrava de alguma forma a transição que Tarantino pretenderia na sua subsequente carreira enquanto escritor e realizador. Se numa primeira parte, demonstrava a violência na sua forma mais drástica e, por isso, quase absurda, através da jornada vingativa da protagonista, na segunda parte existia um maior pathos, à medida que nos aproximávamos do confronto com a personagem titular, que carecia (positivamente) de qualquer violência física para, em vez, mergulhar em maior profundidade nas intenções das suas personagens e dos seus próprios referentes cinematográficos.
A partir daí, a cena inicial de Inglourious Basterds tem sido utilizada como demonstração da maturidade entretanto ganha na abordagem dos filmes de Tarantino. Se antes os filmes eram explorações actuais a géneros conhecidos, existia a partir daí um maior interesse em criar cenários de maior realismo, cuja violência estava patente, mais do que na sua expressão visual, na tensão criada pela abordagem, linguagem e pensamento dos seus antagonistas.

No entanto, se a violência é já utilizada de uma forma que maior tensão proporciona que entretenimento, ao chegarmos ao momento climático de um dos seus filmes parece agora ser expectável esse momento à la Tarantino. O climático e violento confronto até ao qual o filme caminharia. E em Django Unchained estranhava-se o uso de uma cena de violência completamente gratuita e caricata, levada a um extremo inegavelmente cómico contrariando ainda assim o tom da narrativa até então mantido. É perceptível, aqui, mais uma vez isso, mas enquanto em filmes anteriores esse cenário era decorrente de um culminar de confrontações entre personagens, provém aqui o que aparenta uma semelhante situação do acaso de uma decisão aleatória, e que em nada representava as decisões dos atacantes em questão, já que não temos conhecimento até lá dos seus ideiais.



É este facto em particular que chama maior atenção para a estranheza que este empreendimento cinematográfico apresenta na sua base. Ainda que o cenário alternativo que aqui serve o final do filme seja um interessante e agora recorrente pensamento do realizador em apropriar-se de cenários reais para apresentar uma ficção, uma História, alternativa, de forma alguma a contextualização da carreira ficcional de Rick Dalton serve esse momento climático.
Continua assim a existir uma clara separação entre duas partes do filme, como se se mantivessem resquícios da separação que ofereceu a Kill Bill e que, então, beneficiava cada filme. Aqui, aquando de uma separação temporal, ocorre a transição para um filme totalmente distinto, com uma narração dos eventos por Kurt Russell, desnecessária e não coadunável de forma alguma com a subtileza da forma como os eventos anteriores foram até aí narrados, numa aplicação enfraquecida da divisão por capítulos que parecem surgir de narrativas distintas.

São esses eventos, ficcionais mas espelho da realidade de uma (ou várias) épocas e personalidades, que se apresentam como o interesse do filme, ainda que muitos expectadores vão à espera da violência que tanto marca a carreira de Tarantino. É o descorrer sobre a vida de um actor no limiar da sua carreira em Hollywood, obrigado a fazer papéis secundários, sedento pelo contínuo sucesso que o início da sua carreira lhe possibilitou e decaíndo numa consciente mas inescapável sabotação do próprio trabalho que vê como embaraço, que oferece a viagem que claramente interessava ao realizador, por até tomar mais tempo de ecrã, e verdadeiro crescimento da filmografia do autor.
E não é só a temática subjacente, mas também toda a demonstração dos bastidores do cinema e televisão, dentro e fora de Hollywood, num verdadeira exercício de metalinguagem sobre o seu próprio trabalho e sobre os westerns, culminada na amostra dos bastidores da filmagem de uma cena, em que somos levados a tomar mesmo especial atenção ao trabalho de câmara, e ao trabalho do próprio Rick Dalton na sua transição para uma outra personagem. "That was the best acting I’ve ever seen in my whole life": reparamos no que poderia ter sido uma frase nossa, face a própria carreira de DiCaprio nos últimos anos, escolha de casting que também não terá sido deixada ao acaso.

É inegável a paixão de Tarantino pelo cinema, não apenas pelos inúmeros filmes que lhe têm vindo a oferecer inspiração directa e indirecta, mas pelo próprio processo de realização. Se em Inglourious Basterds já estava patente a utilização do cinema como uma arma, metafórica e literal, de alteração e convocação de ideais, aqui somos confrontados com a visão do realizador sobre a indústria e, mais, o próprio meio linguístico.
É engraçado que, no final, exista uma decisão feita frente a uma encruzilhada, visto que a Tarantino acresce o seu interesse em aprofundar temáticas de preferência mas continua a enveredar por "vícios" do passado, como se tivesse o receio de se libertar das amarras da carreira anterior, muito como este seu protagonista. Talvez este seja o prelúdio para o (prometido) último filme que, finalmente, finalizará a sua carreira e comprovará o interesse da mesma a longo prazo, na história do cinema que ele próprio invoca.



1 comentário:

  1. Tem na Netflix esse Era Uma Vez Em Hollywood , mais nós brasileiros não podemos ver pois está na região EUA imagina o tanto de filmes sucessos do cinema que chegam até a Netflix , mais não a região brasileira , para nós BR's vermos uma vergonha mesmo 😤

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