domingo, 22 de agosto de 2010

Alma Perdida, por Carlos Antunes


Título original: Cold Souls
Realização: Sophie Barthes
Argumento:
Sophie Barthes
Elenco: Paul Giamatti, David Strathairn, Dina Korzun, Katheryn Winnick e Emily Watson

O peso da alma é enorme, mesmo que ela tenha o tamanho de um feijão. Ela é o impedimento de uma grande interpretação de O Tio Vânia.
Mas a sua ausência é, igualmente, pesada. A alma é o lastro que temos com a realidade, com a interacção com os outros e com a aceitação de nós mesmos.
E a alma só ganha importância quando nos é (literalmente) roubada e a partir desse ponto, recorrendo a uma alma de recurso é possível descobrir na alma alheia a beleza que ela própria não encontra e, daí, a beleza da nossa própria alma.


O jogo à Charlie Kaufman não é para todos e mesmo podendo ser injusto estar sistematicamente a comparar filmes mais inventivos com os do argumentista, não deixa de haver motivos para isso.
Cold Souls está bastante perto da ideia de Ficção Científica banalizada no quotidiano actual de The Eternal Sunshine of the Spotless Mind. Uma Ficção Científica apontada à emoção e às relações e na qual os artefactos e as possibilidades de futuro são quase artesanais.


A verdade é que, enquanto o filme é isso mesmo é delicioso e inventivo.
Até a interpretação visual das almas é de uma graça de fundo muito bem pensada.
Mas isso é a metade inicial do filme e, depois disso, Sophie Barthes não sabe o que fazer com a brilhante ideia inicial.
Mesmo com a inclusão da personagem da traficante de almas que vai acumulando "restos" das almas que transporta no seu interior, um contraponto muito interessante a um Giamatti insensibilizado, o argumento banaliza-se e torna-se comum na sua segunda metade.
Toda essa segunda metade é uma procura caricata da alma roubada de Giamatti mas que poderia ser um filme sobre qualquer forma de tráfico sem que a alma, aqui, faça a diferença.


Contra essa diferença de interesse no filme corre a excelente interpretação de Giamatti.
O actor interpreta a personagem do actor, um jogo de ideias dele próprio a submeter-se a ser personagem - e a não ser ele próprio mas a interpretação que ele faz da visão que outros têm dele.
Todo um jogo de ressonâncias entre ficção e realidade que Giamatti aborda com a sua habitual dedicação que faz parecer tudo fruto da facilidade.
As interpretações de Giamatti são reconhecíveis como podendo apenas vir dele, mas nenhuma é igual à anterior. A versatilidade dentro do seu próprio papel - nascida da incorporização do papel em si e de si no papel - torna-o magistral.


Por mais que quisesse, por ele, apreciar mais este filme, não consigo ignorar a quebra, mesmo a meio, que ele sofre.
Ter uma ideia brilhante é fruto de inspiração e óptimo para fazer nascer um filme, mas o esforço necessário para tornar uma ideia num objecto completo, tão entretido quanto artístico, é indispensável. E o verdadeiro génio vem dessa capacidade de saber trabalhar uma única ideia.



3 comentários:

  1. Foi uma das minhas maiores desilusões em muito tempo. Tinha tudo para ser genial e fica-se pela vulgaridade...

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  2. Foi uma das minhas maiores desilusões em muito tempo. Tinha tudo para ser genial e fica-se pela vulgaridade...

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  3. Eu não considero uma desilusão. Está longe de ser excelente, mas agradou-me bastante.

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