domingo, 23 de janeiro de 2011

O Preço da Traição, por Tiago Ramos



Título original: Chloe (2009)
Realização: Atom Egoyan
Argumento: Erin Cressida Wilson e Anne Fontaine
Elenco: Julianne Moore, Amanda Seyfried e Liam Neeson

Uma das falhas na distribuição portuguesa deste filme começa de imediato na atribuição do título, traduzido de Chloe para O Preço da Traição, reduzindo-o assim ao nível de um melodrama, perdendo o enfoque na personagem que efectivamente devia ser a principal e mais importante da trama. A verdade é que não só o título em português como o próprio argumento cai nesse erro. Remake do filme Nathalie... (2003) de Anne Fontaine (Coco avant Chanel), o filme é na verdade uma mistura entre thriller erótico e melodrama sobre crise matrimonial.



Filmado pelo egípcio Atom Egoyan, que já trouxe através da sua filmografia obras repletas de sensualidade, este é na verdade um interessante filme sobre as relações humanas, sobre o poder das palavras e da sexualidade. Apesar da previsibilidade da cena inicial, esta permite contextualizar a ideia que o filme quer passar ao espectador. As palavras seduzem. Escolhidas a dedo, utilizadas com cuidado, com rigor e intenção, proferidas de forma sibilante, as palavras são o ponto crucial para toda a trama. E curiosamente até na escrita do argumento as palavras – a narração – ajudam a criar o ambiente sedutor que o filme devia ter sempre. E essas descrições, o subentedimento, são superiores às cenas mais eróticas e sensuais que permitem trazer a este O Preço da Traição um outro tipo de público, mas que limitam o poder que poderia ter e nunca chega a alcançar na sua plenitude. É essa descrição que o realizador utiliza para manobrar o espectador ao longo do filme e que resulta numa interessante e produtora produção.

Contudo, O Preço da Traição limita-se a si próprio por não ousar ser arrojado e ser mais conservador do que tenta aparentar. O argumento, adaptado por Erin Cressida Wilson (Secretary e Fur: An Imaginary Portrait of Diane Arbus) é morno quando não o devia ser e oscila entre géneros sem nunca se diferenciar de restantes obras semelhantes. Tanto provoca como volta atrás, fazendo com que por vezes se perca o clima de tensão associado ao thriller que prometia ser. Mas avaliando do ponto de vista do melodrama, existe um interessante foco nas relações humanas e nas consequências da insegurança entre casais, conduzindo a momentos cativantes sobre a obsessão.



Amanda Seyfried, a nova menina-bonita de Hollywood depois de Mamma Mia!, Dear John, Jennifer’s Body ou Letters to Juliet, tem um papel interessante nas suas mãos, mas quando o filme deixa de ser Chloe para ser O Preço da Traição perde a capacidade de monopolizar a trama, trazendo alguns momentos inconstantes na sua prestação. Vale-lhe sobretudo a sua aparência e algum potencial. Já Liam Neeson, secundário tanto na história como na prestação, que não revela todo o carisma necessário para a personagem, não convencendo como o marido que deixa insegura a sua esposa. Mas é claramente – e obviamente, diga-se – Julianne Moore que ilumina todo o filme, num desempenho seguro, consistente e directo mesmo dentro da insegurança transmitida pela personagem. É sobretudo ela que eleva o filme.

Atom Egoyan é exímio na construção dos olhares subtis entre cenas, nos planos sedutores, atento aos detalhes e assente na prestação das duas protagonistas femininas. O mesmo se passa com a fotografia de Paul Sorossy e com os cenários de Jim Lambie (ambos trabalharam com realizador em Adoration). Já a interessante banda sonora de Mychael Danna (The Time Traveler’s Wife) peca por se excessiva em grande parte do filme, estando sempre acima do ideal, prejudicando-o em algumas cenas.



O Preço da Traição é um filme envolvente, entretenimento provocador, mas que infelizmente derrapa principalmente na recta final. Um fim descuidado que deita por terra algum do esforço ao longo do filme, justificado e resumido por uma obsessão, até grande parte da trama dificilmente sugerida. É pena porque a proposta era realmente interessante.

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