segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

127 Horas, por Carlos Antunes


Título original: 127 Hours
Realização: Danny Boyle
Argumento: Danny Boyle e Simon Beaufoy
Uma intenção clara de 127 Horas é aprisionar-nos no mesmo espaço em que se encontrava Aron Ralston.
Encerrar-nos e ameaçar-nos não só com o isolamento mas com o fechamento naquele espaço e naquele tempo de sobrevivência.
O efeito das imagens deveria ser o da claustrofobia, da tensão permanente e cruel mesmo para a maioria dos espectadores que estavam familiarizados com o resultado final da situação retratada.
O que interessava era o processo de permanência naquela situação-limite e não a expectativa da confirmação de uma cena brutal.


Essa intenção é constantemente minada pela obsessão pop de Danny Boyle com as possibilidades da realização.
Danny Boyle procura um efeito extra que eleve a capacidade das suas imagens, mas tal procura não adiciona nenhuma dimensão ao momento específico em que se insere.
Essa obsessão, exemplificada pela filmagem de uma palhinha vazia cuja demonstração já tinha sido dada pelo som, retrai sempre o espectador do lugar onde o realizador o tenta enfiar.
Em vez de transformar a cadeira de cinema em paredes de rocha comprimindo o público, Danny Boyle traz-nos de novo à consciência que estamos numa sala de cinema.


Estes truques de realização de Boyle, que só muito raramente se justificam nos seus filmes, não tinham nenhum lugar neste filme.
Com elas quebra a intervalos regulares a clausura que James Franco faz por ser sentida de forma tão intensa.
Num filme que exigia em absoluto que se mostrasse o Cinema como a arte da hipnose e do esquecimento do meio envolvente, Boyle traz o público tantas vezes de volta à sala que se torna impossível a partir de certo ponto voltar a deixar que nos leve para o desconforto daquela rocha.


James Franco merecia mais apoio da parte de uma realização que parece querer sobressair mais do que a sua interpretação constrita.
James Franco tem um papel que marca uma carreira, por ser um papel imerso no vazio e que só pode procurar apoio em si mesmo.
Havendo cenas que certamente tiveram de correr mais livres e longas, por isso mesmo sujeitando Franco a uma submissão à personagem e ao confinamento, é preciso reconhecer quão impressionante e perigoso terá sido para ele viver de forma realista e concentrada os violentos picos de emoções extremas.
Ele sim é o filme e nele se devia ter focado o filme de forma implacável dando o retorno exacto ao investimento do actor. Ou seja, mesmo quando ele está sujeito a alucinações ou lembranças, estas deviam ser filmadas nuas de efeitos, tão agrestes como a situação de onde provém.
Assim o filme retribuiria a interpretação de James Franco, em vez de rasgar com os efeitos que ela tem (como o poster acima inevitavelmente parece confirmar).


Se houvesse um breve questionário à saída da sala para saber que cena permanecia com o espectador, estou em crer que haveria uma a vencer contra a (sonoramente) histriónica cena da amputação.
Seria aquela em que Franco filma um talk show para si próprio. Ele, sozinho, criando personagens e fazendo humor. Mantendo a lucidez através do humor e, ao mesmo tempo, ameaçando cair na loucura.
Cena feita apenas com o intercalar do plano da pequena câmara que ele tem consigo e de outro que igualmente lhe foca a cara.
A solidão do actor e a limpidez da realização tornam essa cena memorável. Devia ser assim o filme todo e não é e isso demonstra quase tudo o que deixei escrito para trás.


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