quinta-feira, 19 de maio de 2011

Cannes 2011: Dia 7 e 8



Ao sétimo dia do Festival de Cannes, o finlandês Aki Kaurismäki foi bem recebido pela crítica, sendo Le Havre considerado «mais consistente» em relação a outras obras do realizador. Dentro das habituais questões fracturantes da sociedade como habitual no seu cinema, o filme explora a migração com uma «sensibilidade delicada, rara no cinema dos nossos dias». Uma comédia que respeita as «convenções do género clássico» e que mesmo sendo quase sempre mudo, fala pelos silêncios, cores e cenários, tida como «deliciosa». Embora não ofereça soluções para os problemas que coloca, a subtileza do filme é precisamente essa, oferecendo a quem sofre deles «um refúgio cinematográfico da vida real».



Alain Cavalier chega a Cannes com um mockumentary protagonizado por si próprio e Vincent Lindon, onde se brinca com a política francesa. Pela proximidade, Pater foi melhor recebido pelos franceses que pelo restante da crítica internacional. Não só pela temática familiar, mas também pela presença da estrela maior francesa Vincent Lindon (e que muitos afirmam ser a única razão para o filme estar em competição). Para esses «a paródia improvisada e interminável tem os seus momentos», sendo um filme «presunçoso e inconsequente» e que funciona apenas como uma «piada privada».



Fora da competição e o grande buzz do dia foi a estreia de The Beaver, levando as grandes estrelas norte-americanas Mel Gibson e Jodie Foster à passadeira vermelha de um festival que vive muito do mediatismo. O filme recebeu uma ovação no final da sessão (mas não terá sido da presença da realizadora e actores?), mas nem por isso foi muito elogiado. Embora tenha «momentos divertidos», não deixa se notar o abismo entre a «gravidade da depressão e a desagregação familiar» e «o ridículo da situação», dividindo-se entre um tom sério e um tom cómico, nunca conseguindo encontrar o meio termo, tornando o filme «cansativo e difícil». Também fora da competição, o documentário The Big Fix, foca-se sobre o desastre do derrame de petróleo no Golfo do México e foi considerado «provocador», expondo uma crítica à América capitalista.



Já na secção Un Certain Regard, foram exibidos o mexicano Días de Gracia sobre três raptos passados no Campeonato Mundial de Futebol em 2002, 2006 e 2010 e que recebeu uma grande ovação, mas é visto apenas como um «thriller sob uma perspectiva forte»; Sknoonheid - o primeiro filme africano a ser exibido em Cannes - que parece «uma curta-metragem transformada numa longa-metragem» e «falha em encontrar o seu ritmo»; a co-produção portuguesa (Ukbar Filmes) e chilena Bonsái que celebra a «vida e a literatura» num ponto intermédio e «doce» entre a «melancolia e o humor»; e por fim Tatsumi que usa os desenhos de Yoshihiro Tatsumi (um dos mais importantes artistas de manga japoneses) para criar uma adaptação de cinco histórias suas, além da sua própria biografia.



Ao oitavo dia, a Croisette parava com a ideia do dia começar com Melancholia. O mais recente filme do polémico Lars von Trier foi recebido com alguma apatia perante a crítica que o considerou «aborrecido», «letárgico», um «estudo vazio e frustrante», considerado até pelo crítico João Lopes como o «filme-desilusão do festival», descrevendo-o com a expressão «banalidade "transcendental"». Outros acham-no uma «resposta lúcida ao cinema de grande escala de Hollywood no formato de um melodrama íntimo focado nas mulheres». O desempenho de Kirsten Dunst não foi ignorado, havendo quem afirme que esta é a «chave do sucesso do filme» e que esta renasceu, tornando-se uma forte candidata ao prémio de Melhor Actriz em Cannes. Da parte da facção apoiante, o filme foi considerado «hipnotizante, visualmente deslumbrante», com uma belíssima sequência inicial e uma espantosa cena final, havendo até quem se arrisque a afirmar que este é dos seus melhores filmes. Contudo, o cineasta não deixou de chocar na conferência de imprensa afirmando-se «nazi» e que até «compreende Hitler», que Melancholia bem que podia ser uma «porcaria» e que «talvez nem merecesse ser visto», afirmações que foram mais tarde alvo de um pedido de desculpas por parte de Lars von Trier, mas que se sabe que foram feitas num registo cómico e chocante, propositadamente.



Correram hoje também alguns rumores por Cannes que a Palma de Ouro este ano poderia pertencer a Naomi Kawase pelo seu Hanezu no tsuki, como uma homenagem ao Japão. Afirmações e acusações arriscadas à parte, já que é considerado uma «resposta frágil ao cinema de Terence Malick», considerado por uns um «devaneio poético e amorfo», mas que para outros impressiona pelo «movimento e estilo impressionistas» e pela «abordagem poética do drama humano, do amor e do início do mundo».



Fora de competição, La Conquête ousa traçar a ascensão política de Nicolas Sarkozy, abordando até o seu divórcio. Denis Podalydès, que interpreta o presidente francês, é considerado um «casting irrepreensível» dada a sua semelhança e a fácil captura de expressões e tiques. É considerado um filme «mordaz e cáustico», mas que vai pelo caminho fácil de abordar os factos como uma replicação de uma notícia, faltando-lhe «ousadia e subjectividade». Na secção Un Certain Regard, o Trier que surpreende é Joachim Trier com Oslo, 31. August, segunda longa-metragem do realizador, de uma «sensibilidade perdida» e com uma «conclusão romanticamente trágica, mesmo que cliché». O filme confirma o realizador como «talentoso» e com uma «abordagem orgânica». Também na mesma secção, The Yellow Sea do sul-coreano Hong-jin Na confirma o cinema de acção asiático, sendo considerado por vezes um pouco «desajeitado».

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