quarta-feira, 7 de abril de 2010

Fur – Um Retrato Imaginário de Diane Arbus, por Tiago Ramos



Título original: Fur: An Imaginary Portrait of Diane Arbus (2006)
Realização: Steven Shainberg
Argumento: Erin Cressida Wilson e Patricia Bosworth
Elenco: Nicole Kidman, Robert Downey Jr. e Ty Burrell

Raras vezes no cinema tivemos alguém com o arrojo suficiente para realizar uma biopic imaginária de uma personalidade. Factos são factos e muitas vezes o espectador não vê com bons olhos essa ligeira subversão daquilo que consideramos como verdadeiro. Daí se pode explicar a recepção fraca deste retrato imaginário da fotógrafa Diane Arbus, nos finais dos anos 50 e início dos anos 60, quando assumiu o controlo criativo daquela que viria a ser a sua obra.



Diane é reprimida artisticamente. Reprimida pelos pais, reprimida pelo marido, reprimida pela função de assistente de fotógrafo do próprio marido. E Diane tem visão artística. É ela quem compõe o arranjo para as fotografias de catálogo de peles da família Arbus, é ela que – imaculadamente – camufla as mulheres ideais que dão cara a anúncios padronizados. Mas Diane mantém uma visão crítica e aquilo que lhe é pedido não é suficiente. E a partir do momento em que conhece um estranho vizinho, iniciamos uma espécie de viagem ao mundo imaginário de Diane.

Fur – Um Retrato Imaginário de Diane Arbus, primeiro que tudo, prima pela técnica. E desde o primeiro minuto que encanta pelos planos detalhados da câmara, pela subtileza com que nos faz entrar neste mundo bizarro e estranho. Pela reconstituição histórica fantástica, pelos cenários de Carrie Stewart (The Savages), pelo guarda-roupa de Mark Bridges (There Will Be Blood), pela magnífica banda sonora de Carter Burwell (Where the Wild Things Are) ou pela fotografia de Bill Pope (Matrix).


E depois temos o argumento. Complexo de ingerir, mas complexo de digerir, acima de tudo. Isto porque temos uma mistura de ficção e realidade, cheia de fantasia, que não agrada a todo o tipo de público. Ao conhecer o seu estranho vizinho iniciamos essa viagem fantasiosa que permite a Diane Arbus a saída do limbo onde se encontra e explorar a vertente artística que lhe deu nome. Arriscado em demonstrar essa revelação, mas exímio nessa fusão e visão. Uma espécie de fábula com inúmeras referências literárias como A Bela e o Monstro e Alice no País das Maravilhas ou ainda cinéfilas como Freaks (1932), de Tod Browning. Um mundo bizarro e belo, uma descoberta. Uma interessante relação ambígua entre Diane e Lionel, uma relação que psicologicamente teria muito a ser estudada, dada a sua ligação com o negócio das peles.

Este que vos escreve não morre de amores pela Nicole Kidman, mas na verdade, ninguém melhor que ela, na sua profunda pose aristocrata, conseguiria dar a pele a Diane nesta sua fase de passagem e saída pelo limbo da monotonia. A actriz convence espectacularmente bem. E depois ainda Robert Downey Jr., que mesmo debaixo do seu manto de pêlo, consegue revelar ao espectador o seu interior mais profundo.



Contudo, o que peca Fur – Um Retrato Imaginário de Diane Arbus é alguma monotonia e arrastamento na trama. E um ponto em que achamos que estamos a assistir a mais do mesmo, numa espécie de auto-loop. Ou ainda o facto de não dar ainda mais destaque à biografia de Diane Arbus, como por exemplo, o seu suicídio. Contudo, no seu global é um filme fascinante. É artístico, mas não é pretensioso. É original. Em homenagem à sua abordagem artística da Arte.

Classificação:

10 comentários:

  1. Uhlálá. 4 estrelas? Por acaso já gostei mais de Nicole Kidman, mas não é ela senão a responsável por algumas das minhas performances femininas preferidas da década 00. Nunca tive especial para curiosidade para ver o filme, mas aqui está uma referência a ter em conta.

    Cumps.
    Roberto Simões
    » CINEROAD - A Estrada do Cinema «

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  2. A mim surpreendeu-me imenso. Ainda para mais perante as críticas negativas que havia lido. É um filme subtil e cheio de apontamentos que a mim me soam bastante bem. Quanto à Nicole Kidman... não preciso de dizer muito mais, de facto não gosto dela, mas neste filme agradou-me.

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  3. Também gostei do filme, ainda que em menor grau. Atuações muito boas.

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  4. Como não tinha grandes expectativas surpreendeu-me!

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  5. Puxa, mas que interessante. Nem me lembrava muito da existência desse filme, mas desde a época do lançamento ele pareceu interessante. Diante desse "reavivamento", vou tentar pegá-lo em DVD algum dia.

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  6. Eu acho que vale a pena. Não é um filme brilhante a todos os níveis, mas gostei bastante mesmo.

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  7. Comprei-o por uma recomendação de um amigo, mas ainda não o vi. Confesso que a tua crítica me deixou intrigado, e devo vê-lo brevemente.

    Abraço

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  8. Conforme já disse aqui: as expectativas baixas ajudaram muito.

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  9. Excelente, gostei de tudo, desde a melancolia arrastada do filme, aos ambientes, cores, contrastes de
    luz, enigmas e a excelente interpretação de Nicole Kidman. Interpretei o simbolismo dos nus no final do filme como a transparência natural para onde o filme nos arrasta.

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