domingo, 16 de setembro de 2012

Enquanto Dormes, por Carlos Antunes


Título original: Mientras duermes
Realização: Jaume Balagueró
Argumento: Alberto Marini
Elenco: Luis Tosar, Marta Etura e Alberto San Juan

Mais fácil é gostar de um filme quando o seu protagonista é um actor memorável que deixou saudades desde Celda 211 e que, desde então, não voltou a ter oportunidade de passar pelos nossos ecrãs.
A sua presença é um bom indício e, no final, confirma-se que Luis Tosar é quem traz mais este filme  à tona num mar de filmes irrelevantes.
Ele dá profundidade a uma personagem que por algum tempo parece apenas um bufão em quem a diversão deu lugar à perfídia.
A forma como ele se vai revelando como mais do que criança cruel causa-nos tanta empatia inicial quanto revolta final.
Os seus actos como vingativo elemento  do mais ignorado - senão mesmo desprezado - estrato social são, também, a tentativa de deixar o mundo como ele próprio, triste e desolado.
A sua escalada de obsessivo capaz das mais variadas ilegalidades para elemento verdadeiramente violento passa por patamares de racionalidade que indiciam o seu verdadeiro grau de maldade e que, finalmente, nos fará repudiar aquela figura triste.
O assassinato é um acto grave mas que parece o inevitável no seu comportamento. Só não é o ponto mais grave a que vai.
Quando o experimenta, sabe que o seu modus operandi para o futuro será mais violento fisicamente porque lhe permite ser eficaz, deixando em sofrimento imediato quem sobrevive.
Mas psicologicamente a sua verdadeira eficácia já vinha de antes, pois se ganhou algum gosto à morte, é sempre pela eficácia que a sua estratégia se monta.
Já naquele momento em que diz à velha Dona Verónica, com o mais afável sorriso, a mais cruel forma da verdade que é possível articular.
Destrói-lhe a existência pela mágoa profunda, roubando-lhe o mais ténue contentamento a que ela podia aspirar numa vida solitária como a que leva.
O assassinato serve-lhe porque nem sempre terá como alvo uma jovem mulher a quem possa fazer o que a última carta de amor anuncia e o público desconfia desde a primeira cena...
Até esse final, este é um filme eficaz, embora num ou noutro momento não surpreenda. E, sobretudo, mostra quem, na dupla responsável por [REC] tem talento quando o material é bom o suficiente.
Jaume Balagueró trabalha bem o material, embora sem sempre com o foco óptimo - as exibições de Clara (Marta Etura) tornam-se redundantes - mas, sobretudo, sabe deixar-se levar por Tosar, que é sinal de inteligência.
Uma boa notícia encontrar (finalmente) um filme espanhol desta qualidade no MOTELx, embora me pareça que não haja algum distribuir que se aperceba que há mais locais além de Hollywood (The Resident com a mesma premissa era lixo) ou que há mais figuras para um star system espanhol que não Pedro Almodóvar (sobretudo um Almodóvar em declínio).


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