O alemão Werner Herzog regressa aqui aos temas que sempre e de forma consistente o preocuparam: a vida, a morte, a dor e a tragédia. Temas complexos, tratados com subtileza - mas que não se coíbe de mostrar claramente os factos - sempre ligados a um teor de certo modo filosófico e de debate que o cineasta gosta de imprimir aos seus trabalhos documentais. Já assim o era e de um modo muito mais factual no recente Cave of Forgotten Dreams e que estreou nas salas portuguesas no início do ano e em Into the Abyss continua esse seu questionamento da vida. Centrado no triplo homicídio que levou o norte-americano Michael Perry ao corredor da morte e posterior execução no Texas, o tom do documentário é sempre preciso, seco e simultaneamente comovente, mas sem nunca se aproveitar da dor e sofrimento alheios para pura exibição.
Onde ganha em sensibilidade, Into the Abyss perde em foco, já que inicialmente não percebemos bem qual a sua intenção, quando ainda no prológo questiona ao capelão da prisão «Porque Deus permite a pena capital?» ou quando expressa francamente a sua opinião contra a pena de morte por «respeito ao ser humano». Contudo, gradualmente vamos percebendo que apesar de manifestar a sua opinião acerca dos temas - como aliás costuma fazer - a amplitude de intenções é maior, quando subtilmente questiona todo um poder político que vai desde questões administrativas, passando por temas como educação e família. O formato documental de perguntas e respostas resulta aqui porque mesmo quando aparentemente questiona temas corriqueiros, Werner Herzog é subtil e certeiro na captação da tragédia da situação e ao mesmo tempo no humor involuntário e sinistro, que apenas denuncia um sistema cheio de falhas. Não se trata aqui de justificar um horrendo e violento homicídio triplo ou, de forma panfletária, opôr-se à pena de morte, trata-se sim de questionar o sentido da vida e expor lado a lado e de modo imparcial a mesma questão: o homícidio cometido pelo criminoso e o cometido pelo Estado ao condená-lo à morte. É o mal estar de uma sociedade injusta e desigual vista pela lente de um cineasta que procura também ele o sentido da vida.
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