quinta-feira, 7 de novembro de 2019

Midway, por Eduardo Antunes


Título original: Midway (2019)
Realização: Roland Emmerich
Argumento: Wes Tooke

Não somos estranhos a filmes de guerra, muito menos representativos da 2.ª Guerra Mundial, em particular da perspectiva americana. Foram já os diversos realizadores a dar o seu cunho, positiva ou negativamente, a este pedaço da história mundial. É por isso entorpecedor estar perante um filme que, com vistas tão largas sobre o que pretende transpor para o ecrã, acaba por oferecer tão pouco de relevante à História contada.

Desde a perseverança pelo meio dos horrores da guerra, como em Saving Private Ryan, até a um lado (literalmente) romantizado de, por exemplo, Pearl Harbor, são diversas as visões adoptadas sobre o segundo grande conflito mundial do século XX. Midway situa-se entre estas duas perspectivas, o que acaba por ser a pior das situações possíveis, por não conseguirmos avaliar a sua honestidade, ainda para mais tendo em conta a escolha do realizador em causa.

Entende-se aqui a ideia de homenagear as histórias dos soldados que concretamente contribuíram para os eventos assinalados, mais que não seja pelas obrigatórias descrições biográficas no final do filme, e parece haver uma vontade honesta por parte de Emmerich e Tooke em contar a história destes soldados, faltando-lhes no entanto as ferramentas para o fazer. Se a filmografia de Emmerich nos demonstra algo é a subtileza inexistente para contar uma história que pede a nossa simpatia para com os homens retratados.

Não existe aqui também nenhuma razão singular na forma de contar esta narrativa com esta equipa. Letters from Iwo Jima oferecia a perspectiva japonesa do conflito sobre o olhar cuidado e sensível de um realizador norte-americano, e ainda mais recentemente em Dunkirk não existiam soldados nomeados ou assinalados - protagonistas na acepção primordial da palavra -, apostando ao invés na demonstração crua e real da tensão e horror de uma situação extrema em tempo de guerra. Aqui, para além de contar uma parte da História (quase) inédita no grande ecrã, não há nada que perdure na memória após os créditos. Nada que formalmente nos sensibilize para a importância desta batalha na "resolução" maior do conflito.

Até porque, aliás, a necessidade de contar a história desde o ataque a Pearl Harbor, com mais um retrato do mesmo pelos olhos de personagens imediatamente retiradas da narrativa, retrai todo o restante filme, cujo argumento se vê obrigado a abordar todos os passos entre cada conflito, saltando meses de cada vez com apenas um aviso dificilmente legível, até chegarmos aos momentos finais do combate em Midway.

Começando a narrativa com uma conversa entre Edwin Layton (Patrick Wilson) e o Admiral Yamamoto (Etsuhi Toyokawa), somos logo remetidos à partida para as possíveis decisões que levariam ao ataque a Pearl Harbor. Mas aparte essa fraca indicação, nunca temos um olhar mais atento sobre a causa do ataque pela nação nipónica. Apesar do filme no final nos indicar a sua dedicação aos soldados americanos e japoneses, os 140 minutos que compõem a totalidade do filme (possivelmente para estrear no maior número possível de salas de cinema, já que as duas horas e meia de duração reduzem a possibilidade de projecção) não deixam espaço suficiente para se tomar atenção ao lado oriental da batalha no Pacífico, por também quase não haver para o restante.

A casualidade com que toda a narrativa é posta na mesa traz problemas maiores, pois para quem desconheça as particularidades do desenvolvimento desta batalha não conseguirá acompanhar muitos dos pormenores que mereciam maior duração para uma percepção cuidada.
Essa falta de tempo é remetida igualmente para as personagens, cujas relações entre si, aparte uma ou outra recorrentes, são generalizadamente imperceptíveis. Imediatamente nos pedem que sintamos pena por uma personagem perecida em Pearl Harbor pela sua amizade com o protagonista, apesar de nunca os termos visto partilhar o ecrã, nem sequer em analepse. Até a forma casual como Dick Best (Ed Skrein) cumprimenta Edwin Layton num bar, sem contextualização de como se conheceram, demonstra a falta de tecido que interligue os eventos pontuais que populam o ecrã.

Actores reconhecidos vão aparecendo em ecrã para sinalizar importantes personalidades nos eventos, para que as suas poucas cenas não se percam na nossa memória. Mas se Nimitz (Woody Harrelson) ainda tem um importante papel nas tomadas de decisões, o aparecimento de Dennis Quaid ou Aaron Eckhart apenas nos faz questionar as suas mínimas presenças no filme.
O momento que melhor demonstra a falta de sensibilidade do realizador é aquando da morte de uma personagem secundaríssima um minuto após o conhecermos, que apenas não nos solta uma risada pelo absurdo do acaso da cena por ser suposto assinalar um momento de viragem na arrogância de Best. Este último que (não nos dissessem ter sido um verdadeiro soldado), na sua básica apresentação enquanto piloto impetuoso, de sotaque norte-americano serrado, mascando pastilha e de nome "Dick" Best, aparenta quase uma caricatura.

No final, resta apenas uma fraca homenagem, onde nem o realizador se permite as suas maiores excentricidades visuais, remetendo-nos a "sequências de acção" insípidas, pelo meio de uma narrativa meramente descritiva e em nada reflectiva da sua própria importância.
Abaixo, deixo um pequeno documentário que, escolham ou não o visionamento deste filme, informará simples e rapidamente do conflito, para que talvez os eventos retratados não fujam, como a mim, ao vosso conhecimento mais aprofundado.



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